FORMIGAS X TAMANDUÁS

(OBS; é necessário ler primeiro o texto anterior 'NÃO MATEM AS FORMIGUINHAS", pois este é apenas complemento.)

FORMIGAS X TAMANDUÁS

"Quem não conhece o Passado

está fadado a repetí-lo!" (ano 1550)

NICCOLAU MACHIAVEL

"Aonde quer que eu esteja,

trago comigo uma luz

que recebi na Igreja

e é ela que me conduz... (etc)

ABIEZÉR SILVA (+2005)

Costumo ler o regulamento dos Festivais de Música -- mesmo os realizados a 2 ou 3 mil km de distância -- porque sempre trazem exigências curiosas. Um dos primeiros lançados pelo Estado, aqui no Pará (por volta de 1994/96), trazia como novidade (?!) a exigência de partitura -- para todos os inscritos -- presumo até de bateria (existe?!), para os que levaram fita cassette de Banda com 4 instrumentos. Como na época não havia programas de computação que fazem agora esse serviço, o compositor gastou perto de 500 reais só para isso.

O novíssimo Festival do jornal Diário do Pará incorreu no mesmo êrro... amigos, aprendam, só exijam cifras ou partitura dos CLASSIFICADOS. É um crime contra o artista amador -- ou folclórico, como cita o release no site do Jornal -- obrigá-lo a uma sacrifício desses. Em 1987, no meu primeiro festival em terras paraoaras, foi a própria Banda de apoio (do exímio tecladista Paulo Pereira) no evento IV FEMUCAB/SESC que fez não só o arranjo do meu "sambarimbó" (um carimbó com "toques" de samba) como também a partitura dele.

O texto de apresentação o III Festival da Música Popular Paraense não apenas destaca como ACENTUA AS DIFERENÇAS tão decantadas pelo poeta-atleta R. Almeida e, novamente, pela propaganda oficial do ex-governador Jatene, reeleito só Deus sabe porque, já que teoricamente perdeu a cadeira em 2006 porque era ruim. Não é mais?! "Não demos espaço apenas para o que é sofisticado ou POPULARESCO (sic), um cantor folclórico pode concorrer com um pianista, por exemplo". Se não fôr um aplicado aluno da FCG ou da UFPA, o tal cantor de folclore não tem meios sequer para gravar sua obra, quanto mais escrevê-la, em cifras.

Cá entre nós, pianista em festival de música popular é DIFERENÇA demais pro meu gosto. O texto do site encerra afirmando que essa... "variedade musical com jeito paraense é valorizada por seu povo". Pelo visto... será pelos futuros jurados também!

De todos os festivais dos quais ouvi falar, os de Belém continuam sendo os únicos a exigir tempo de residência no Estado (era de 3 ou 5 ANOS, antigamente) como item obrigatório para se participar. Em quê um gaúcho ou goiano "notóriamente radicado no Pará no mínimo há 1 ano" é DIFERENTE (epa!) de um mineiro ou baiano com 10 meses de estadia ou 10 anos? Será que crêem mesmo que basta se pisar nesse Pará-íso (com ou sem aspas, à critério de cada um) para alguém se tornar... paraense? O Governo gasta horrores em propaganda afirmando isso, enquanto escolas, estradas, hospitais, etc, vivem no abandono.

Antes de comentar trechos do regulamento lembro que, no festival citado no início, inaugurou-se o sistema de envelope lacrado e fita gravada sem identificação do Autor. A idéia era só revelar depois o nome dos selecionados... mas, digitando as inscrições em computador -- havia dezenas deles interligados, no CENTUR -- a teoria do sigilo fica comprometida. Nada impede porém que jurados definidos antecipadamente sejam procurados por um ou outro classificado, para uma "conversinha".

Contudo, as conversas (pelo menos entre os jurados) estão liberadas pelo regulamento deste Festival, que autoriza se comunicarem DURANTE as apresentações. Vai ser dificil... os jurados ficam em linha paralela ao palco e, se não tiverem intercomunicador, somente o do centro irá contactar (quase diria, conchavar) com os 4 outros.

O Festival, popular, não tem na final a música campeã por aclamação e voto do povo. Isso tem sido comum em eventos de cidades do sul e sudoeste do Pará. Estadia e alimentação para classificados de locais distantes parece-me que nenhum no pais inteiro tem... exceto um de Minas, com mais de 20 ANOS de existência (e resistência), "distribuído" por 5 ou 10 cidades mineiras. Um recente, da música para os 80 anos do Cristo Redentor, lá no Rio, também nega essa gentileza aos modestos autores amadores. No da SECULT/PA daquela época, enquanto cantores líricos da Europa se hospedavam em hotéis de luxo de Belém às custas do Estado, o mesmo Governo negava até ajuda de passagem (de avião, no caso) para os classificados das semifinais do interior, que viajaram de barco por até dez horas para estarem na final, sem direito sequer à estada numa pensão barata, nos 3 ou 4 dias que tiveram que ficar na Capital, fazendo o trajeto de regresso de novo às próprias custas.

Por fim, uma estranha "inovação" bem paraense no regulamento do Festival do Grupo RBA, para alegria do trovador R. Almeida, que adora tais "diferenças": qualquer questão de direitos autorais é problema a ser resolvido pelo classificado e o órgão arrecadador, a Coordenação "lava as mãos" (e os pés). Que o Jornal não brinque com essa misteriosa "Empresa", que cobra taxa "de direitos conexos" (?!) por TV ligada em bares, hotéis, hospitais, etc e silencia sobre as versões "piratas" de músicas estrangeiras que um bocado de Bandas hoje famosas em Belém (e até fora do Estado) não cansam de produzir. Esse Escritório "tão diferente" dos demais poderá "melar" o Festival do Grupo RBA... é bom não arriscar!

Quanto à promessa de um CD do evento, espero que não fique apenas na promessa. "Coleciono" na memória uns 5 ou 6 festivais (desde o do Banco da Amazônia-BASA, em 1988) de música e outros tantos de literatura (inclusive os da SECULT/PA de 1988/9) que não cumpriram o que rezava o próprio Regulamento... em outros Estados isso daria processo e indenização, mas aqui é tão DIFERENTE !

Um dia todos os Festivais de música serão realmente diferentes... terão uma cláusula em que o participante AUTORIZA (ou não!) a doação de seu CD -- com sua obra gravada com tanto esmêro e carinho -- para as Rádios locais das Cidades onde os tais festivais se realizam. O famoso lá das Gerais teve mais de 1.300 músicas (ou artistas/Bandas) inscritas. Imaginem a injeção de NOVIDADES na programação das Rádios, "engessadas" entre o rap paulista, o funk carioca e o besteirol nascido lá pelos lados da Bahia, Ceará e quejandos, preservando-se evidentemente todos os direitos autorais que, me parece, só os grandes nomes da MPB recebem.

Querem um bom exemplo de desperdício? Por volta de 2003/4 salvo engano a Rádio Cultura FM teve a feliz idéia de um "festival" via ondas de rádio... inscreveram-se 230 ou 240 obras, das quais selecionaram apenas 45 autores, apresentados 3 a 3 durante 2 semanas. Os quase 200 CDs não classificados "foram pro lixo" (ou pro Arquivo) e a própria Rádio estatal -- nesse Pará tão... diferente -- até onde sei jamais tocou (depois do "festival") nenhum deles e muito menos os 30 outros eliminados na fase semifinal.

A finalíssima aconteceu à beira-rio, no famoso Ver-o-Peso... numa Banda instrumental, dos 5 músicos teriam faltado 2 segundo fofocas nos Jornais, mas as regras exigiam a reprodução exata do que fôra gravado no CD inscrito. "Rasgou-se" o Regulamento e a Banda levou o troféu de Melhor Arranjo.

Por falar em arranjo, no único festival oficial em terras ananins (maio/set. 1989) alertei à Direção que certa Banda jovem fizera plágio, sua música era uma "versão" usando toda a melodia de "Flores Astrais", do Sêcos & Molhados. Os jovens não só venceram (?!) o Festival "Espaço Aberto para o seu Talento" como também levaram o troféu de Melhor Arranjo. Com um certo "Tio Bolão" no Júri, fiz irada carta aos Jornais de Belém chamando o evento de "palhaçada".

A História mundial existe hoje porque alguém a contou, oralmente ou por escrito. Conto as minhas estórias, sobre Festivais, nos textos "Os Micos que vivi" e no futuro artigo "Se não me falha a Memória", enquanto as "formigas" da MPB são "massacradas" pelos "tamanduás" que criam as Regras dos tais Festivais.

"NATO" AZEVEDO (escritor e compositor)

ANANINDEUA, Pará, BRASIL