Os Moços de Doze
(De Napoleão Valadares, publicada no Livro - Passagens da Minha Aldeia. Napoleão Valadares é membro de várias instituições de cultura, advogado da AGU - Advocacia Geral da União, romancista, contista, cronista e poeta. Nasceu em Arinos (MG) e vive em Brasília - DF).
Alguns jovens da minha região foram estudar em Cachoeira do Campo. Era início do século. Aristóteles, Veridiano, Marinho do Prado e outros. Estaria saindo a primeira fornada de urucuianos ilustres. Estaria se preparando um grupo que dificilmente poderia ser igualado na região, porque eram moços inteligentes, estavam numa escola de excelente qualidade e tinham recursos.
Imagino as dificuldades que enfrentavam na viagem para a escola. No lombo do cavalo daqui a São Romão, no vapor até Pirapora e, daí para frente, no trem. Mas tudo se vencia e se chegava a Cachoeira do Campo. E iriam e voltariam quantas vezes fossem, que nada segura a força da juventude.
Iriam e voltariam, mas voltaram e não mais foram, porque a direção do colégio mandou cartas aos pais, informando que Veridiano e Marinho não seriam mais aceitos, por causa do comportamento. Bom seria que eles estivessem vivos para que pudessem contar o que aprontaram. Hoje se conta apenas um caso. Marinho, ao ser repreendido pelo catequista, respondeu: "Catequista, eu estou com uma vontade de pular na sua crista..." Isso para os dias de hoje seria nada, mas para aquele tempo... Naquele tempo era o rigor, a disciplina, o respeito, a aplicação, a competência.
Há pouco, tive a oportunidade de ler uma carta que Aristóteles escreveu a seu pai. A carta é de 1912. Uma caligrafia e um conteúdo que não parecem de um moço daquela idade. Os outros também deveriam escrever assim, que na época se aprendia de verdade, e o estudante tinha até aulas de caligrafia.
Mas uma turma voltou e não foi mais para a escola. Interrompia-se a caminhada dos que, por volta de 1912, estavam se preparando para dar à região alguns dos seus luminares. Esse negócio de pular na crista não dá certo.
Observação: de Arinos (MG) a Belo Horizonte são 746 quilômetros e de Belo Horizonte a Ouro Preto (MG) são 96 quilômetros. Cachoeira do Campo é distrito de Ouro Preto. Seu passado de glória o coloca definitivamente no cenário histórico de Minas Gerais e do Brasil.