Escrita
Os olhos opacos e vermelhos não se agüentam mais abertos, com o queixo apoiado na mão, está embalado pelo balançar do trem, ele parece tão cansado, mas é tão jovem, parece não se incomodar com o barulho das crianças que festejam junto ao pequeno rádio de pilha, ele não está ali, não, não posso saber onde está, é em algum lugar só dele, deve ser sempre assim, ilegível, mesmo pra ele, que tem olhos de águia, observador, para si mesmo acaba sendo um desconhecido, torna-se seu maior mistério em mãos, mas não se preocupa, está vazio, vazio, um mártir de sua própria gentileza, seu humanismo é notável, infância, é isso, ele está preso a ela, infância, desde as mechas de cabelo castanho que parecem ter vida própria a curvatura dos dedos da mão, como uma camada de luz que lhe contorna a pele, irradiando, é uma pena que não saiba se expressar de forma compreensível, é uma pena também o fato como aceita esse “perder”, como abandona todas as buscas, de como aceita elogios, de forma quase humilhante, essa insistência em auto-flagelar a alma e o corpo, apenas uma forma de esquecer, a escrita, sua única fuga, por mais egocêntrica e desconexa que essa se torne.