FLOR, MINHA FLOR

“Flor minha flor,

Flor, vem cá!

Flor minha flor

Laiá laiá laiá”

(do cancioneiro popular)

Eu estava pesquisando na internet aonde encontrar uma empresa ou mesmo um setor da prefeitura que cuidasse da remoção de cadáveres de animais para não fazer feio como tanto vejo pela cidade, pessoas jogando nos terrenos baldios, córregos, no lixo da rua (normalmente no do vizinho). Minha cachorra, a Flor, teve uma crise renal seguida de vários ataques convulsivos e não resistiu. Foi assim que me deparei com um site* que além de me fornecer algumas informações, me trouxe um alento para a minha dor e uma explicação racional para esse apego que critico tanto. Não o apego com o animal e sim a sua preferência em detrimento do convívio humano que tem sido tão comum no nosso meio.

Para a psicóloga, Alessandra Carvalho, “Fortes apegos de determinadas pessoas em relação a animais, talvez demonstrem que uma certa carência afetiva ou o distanciamento entre pessoas às vezes existente, possa fazer do animal de estimação um objeto de compensação afetiva”. Para ela, comprar ou adotar um animal é menos perigoso e menos sujeito a sofrimento do que relacionamentos com seres humanos, como por exemplo a adoção de crianças abandonadas. “Ao adotar uma criança, não sabemos ao certo que tipo de ser humano aquela pessoa vai se tornar, não é fácil, em caso de arrependimento, voltar atrás e dizer não quero mais ficar com você”.*

Posso não concordar com tudo o que ela afirma mas concordo que a integração do homem com os animais vem de épocas muito remotas, creio que quando o homem querendo se afirmar como animal superior entre todos ou mesmo por necessidade de um aliado para a sua proteção ou ainda por amor, resolveu domesticar os bichos. Na pré-história eram todos feras. Assim nasceu o bicho de estimação e vem acompanhando o ser humano aonde quer que a gente vá pelo planeta afora.

A discordância está num motivo de foro muito íntimo: prezo por demais o humano acima de todas as coisas e apesar de todas as mazelas e complexidades que as relações sociais engendram. Talvez seja por isso mesmo. Dedico desde muito cedo a minha vida por harmonia, por menos desigualdades, por fraternidade, por afeto coletivo humano. Os animais não estão de fora disso, ao contrário. No entanto, diferencio o humano. Não posso concordar que tenhamos que extirpar o instinto dos bichos impondo-lhes costumes humanos. Acho mais crueldade do que amor. A natureza vilipendiada em quase tudo já basta. É preciso preservar não só a vida, mas a vida com seus hábitos intrínsecos. Um animal domesticado apenas, mas sem hábitos humanos é mais dócil do que aquele tratado como objeto preparado para compensar as nossas faltas afetivas. Ele se apropria do espaço humano e ao mesmo tempo é expropriado de seus costumes, subtraído de suas ligações naturais, modificado em sua gênese. Acho que se tivesse a faculdade do livre arbítrio ia rebelar-se em muitos momentos. Mordida na certa.

A Flor simbolizava um pouco dessa minha tentativa e desse meu apego. Foi-se, deixando uma profunda saudade. Já não vou poder acordar nas minhas madrugadas e tê-la esperando por um afago e dando o seu em troca com brincadeiras e com o carinho habitual. Também não aceitei ofertas de quem para me consolar ofereceu outro cão em seu lugar. Não seria coerente para mim considerar os bichos, no fundo, no fundo, não mais do que objetos de consolo para as mazelas, para a miséria humana chamada falta de afeto.

*fonte: http://deiabastos.blogspot.com/

josé cláudio Cacá
Enviado por josé cláudio Cacá em 30/07/2011
Código do texto: T3127913
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