Futebol e a desgraça nacional
A Copa do Mundo vai acelerar a falsificação da realidade nacional. Nenhum esporte serviu tanto a este propósito quanto a tropelia atrás da bola. O comércio de milhões jamais atenuou a falta de hospitais. Tampouco se comove com algo que seja real dentro da sociedade por mais de dois minutos. Na verdade o esporte em geral, excetuando o nada celebrado xadrez, cumpre o papel de apresentar aos incautos uma sociedade sadia, eternamente jovem, sem nenhum problema coletivo. Falamos de poluição, todavia perdoamos as horas initerruptas de poluição dos grandes prêmios automobilísticos. Os esportes servem para o esquecimento da tragédia real da vida brasileira. Os jogadores são heróis que livram a terra onde pisam de suas mazelas mais profundas. Para tanto ganham fortunas defendendo este papel de ascenção que passa da escravidão ao heroísmo.
Estamos gastando fortunas incalculáveis para que aconteça o delírio das massas pobres maquiadas com a famosa e desgastada “Copa do Mundo”. Evento onde todos correm apressadamente para garantir obras gitgantescas em tempo recorde. Neles se reunirão populações inteiras de privilegiados que poderão vir de todas as partes do planeta para o grande ritual de congregação monoteísta. Enquanto isso falta leito nos hospitais e até hospitais. Falta formação educacional e recursos para a educação, moradia e emprego decente.
Há pouco tempo ter este ponto de vista era uma condenação, coisa de comunista. Mas se tem algo que comunista tem razão é essa luta contra tamanha disparidade. Nós brasileiros vamos ficar ricos após a festividade com esse orçamento captado pelo turismo? O dinheiro arrecadado servirá para pagar as contas astronômicas que sobraram do evento com o cândido nome de endividamento dos estados? Serão criados hospitais modelos e direito a tratamento digno?
O noticiário tem que se aliar ao lucro e vai motivar a compulsão da alegria a todo o custo. Terá um grande cuidado para que o dono da festa ganhe bem para representar a ascenção desse grande momento da nação. Nação que triunfa pateticamente na riqueza em meio a infernal pobreza estandartizada como drogadita marginal antes de miserável na ordem dos fatores de prestígio.
Gostava muito de futebol quando era criança. Futebo é bonito para crianças. Foi o esquema tático quem destruiu a capacidade criativa dos jogadores e a minha ilusão de coisa. Antigamente jogavam com grande rapidez e agilidade de raciocínio. Hoje passam a bola com cuidado de quem analisa um boleto bancário. Na hora dos pênaltis se livram da bola chutando a redondinha na direção dos satélites.
Depois de ganhar suadamente o troféu é ainda preciso esquecer que a taça de ouro e o louro ficam melhores numa grande feijoada derretida. É melhor fundir a taça para que ela fique longe das bajulações de estilo. Como sempre toda colossal arrecadação trata logo de sumir. Positivismo à parte: danem-se os enfermos.
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