SOPA DE BETERRABA

Final das férias de julho, um grupo de casais amigos resolveu se reunir em Santa Tereza, uma linda cidade nas montanhas capixabas. A ideia era fechar uma pousada, curtir o frio, encher os olhos de cores vivas de várias tonalidades, beber bons vinhos, comer queijos e massas caseiras, tocar violão, cantar muito, jogar baralho e adormecer sob edredons de 300 fios, no mínimo.

Saindo em horários diferentes, o encontro se daria numa cafeteria do centro da cidade e, em comboio, iriam para a “Villa Theodora”, uma pousada perfeita para quem não quer ser achado, já que nem sinal de celular se pega por lá.

Curiosamente, os quartos não tinham números e sim nomes de pássaros. Então, houve quem se hospedasse no Sabiá, no Pica-pau, no Bem-te-vi, no Curió, no Canário, no Beija-flor, no Tico-tico, no Canário... Colocadas as bagagens nos quartos, um a um os casais se dirigiram ao restaurante, cuja arquitetura lembrava uma perfeita cantina italiana.

Como a cozinheira só chegaria às 19horas e o jantar só sairia por volta de 22horas, cada casal resolveu organizar “uma entrada” com as coisas que levara: azeitonas pretas, nozes, amêndoas, pistaches, salames, provolone, parmesão, do reino, gorgonzola, emental, brie, gouda....

Cedidas as taças da taverna, apareceram os Casillero Del Diablo, os Toro de Piedra, os Lambruscos, os Santa Helena, os Sunrise, os Du Toitskloof ... e até umas seis garrafas de Chateau Mouton Rothschild Corte 1982, variando as uvas entre Merlot, Cabernet Sauvignon, Pinotage, Syrah, Carmenère e Concord, que desciam às vezes suave, às vezes rascantemente, enquanto o grupo conversava, ria e cantava ao som de um animado violão.

O jantar chegou e com ele as maravilhosas pás de “Cordeiro Medieval” com fettuccine. Após os tiramisùs de sobremesas, o grupo se divertiu ingerindo licor de cachaça em canequinhas de ágata (e não faltou quem brincasse dizendo que “tomar no caneco” é bom), fumando Coyote (cigarrilhas de palha) e Cohibas Behike (charutos cubanos) para desespero dos não tabagistas.

Em dado momento, percebeu-se que a esposa de um amigo, tentava levá-lo para o ninho do “Curió”(esse era o nome de seu quarto), já que seus olhos pareciam os de um jacaré encantado, e a marcha lembrava a das pessoas que pisam no ritmo “aqui tá fundo, aqui tá raso”, denunciando que o seu fígado, acostumado com “malte”, estranhara os flavonóides.

Acredita-se que ele ainda estivesse bem, pois foi esperto o bastante para fazer como o passarinho “João de Barro”: tão logo a esposa entrou no quarto, ele andou de ré, passou a chave na porta e voltou sorridente para cantoria. Para celebrar a sua proeza, verteu metade da garrafa de licor de cachaça sobre uma taça de vinho e a sorveu de um gole só.

Cinco minutos depois, ele sumiu, voltou pálido, sentou-se e ficou com o olhar perdido num ponto infinito. Todos pensaram que, arrependido, ele voltara ao quarto para se desculpar com a esposa e que de lá fora expulso, talvez, com “03 quentes e 04 fervendo”.

Meia hora depois, alguém entrou no banheiro do bar e encontrou uns dois litros de “sopa de beterraba”, entupindo a pia. Descobriu-se, então, onde o danado estivera durante a sua sumidinha.

Procurou-se o hóspede do “Curió” para limpar seu vômito de vinho tinto com pedacinhos vermelhos boiantes... Cadê?! Sumiu, escafedeu-se! E agora? Como deixar a nojeira lá e ficar com a cara rachada perante o dono da Pousada? Cadê vassoura, balde e pano? Só teve um jeito: “Vamos desentupir essa disgrama na mão, nem que seja preciso enfiar o dedo para que os salaminhos e queijos desçam pelo ralo”. E assim foi feito!

Após desinfetar as mãos, o grupo decidiu ir dormir, não sem antes combinar: “Nada de falar para esposa dele, porque ela não vai gostar e ninguém quer ser responsável por brigas de casais, certo?”

Na manhã seguinte, o casal hóspede do “Curió” tomava café linda e fagueiramente, quando um gaiato os cumprimentou dizendo: “Bom dia, fulano! Você adora beterraba, né?”.

Inicialmente estupefata com o inusitado cumprimento, a esposa rapidamente matou a charada, olhou para o marido e disse: _“Beterraba, né? Daqui para frente, lá em casa, o menu só vai ter esse tubérculo: cozido, assado, ensopado...”. Ele a interrompeu e com voz suplicante murmurou: _ “Beterraba não, meu bem, eu odeio beterraba”.

O grupo que a tudo assistia, rindo muito gritou: _“Faz sim! Faz suco de beterraba também! Todo dia!”. Sabe o que ele disse?_ “Oh, gente, eu passei mal porque fiquei “tomando no caneco” e acho que o salaminho estava estragado.”

Um amigo galhofeiramente brincou:_ “Oh, sujeito, você ficou no quarto do Curió não foi por acaso. “RIÓ” em javanês significa “eu gosto de tomar no” e “CU”....é... é isso mesmo!

NORMA ASTRÉA
Enviado por NORMA ASTRÉA em 26/07/2011
Reeditado em 12/06/2024
Código do texto: T3119306
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