Brasília quando longe

Tenho dois anos a menos, e ainda estou morando em Curitiba. Não tenho emprego algum. Sou um jornalista recém-formado e meu currículo é simples e vazio. Preciso dar um jeito de arrumar dinheiro porque, entre outras coisas, quero viajar. Pretendo ir para Brasília. Eu poderia escolher uma porção de cidades mais próximas, mas escolhi justamente a capital do país. Se alguém me perguntar, direi que estou indo em busca de trabalho – e no fundo estou também. Tenho vergonha de dizer que quero ir para Brasília, principalmente, por causa de mulher. Mas agora estou apenas escrevendo, e então eu confesso qualquer coisa. Estou querendo ir para Brasília por causa de mulher. Só que estou sem trabalho e, portanto, também estou sem dinheiro.

Ajo como um viciado e começo vender as coisas da casa que não me interessam mais. Estou caminhando agora pelo centro de Curitiba com uma mochila cheia de livros e revistas usados – todos os que consegui encontrar ao revirar a casa. Consegui juntar também alguns CDs e até mesmo uma enciclopédia. Coloquei alguns poucos gibis – não quero me desfazer da minha coleção. Eu preciso de dinheiro, mas não tenho muita coisa de valor para vender. Então, tudo o que me ocorre fazer é ir a um sebo. Sei que não vou conseguir o suficiente, mas já ajuda. Existe uma morena em Brasília e eu quero vê-la.

Estou em um sebo e abro a mochila. No fundo, eu não queria me livrar de nada daquilo. Um homem pega os meus livros e começa a avaliá-los. Agora, eles são simples objetos comerciais. Na semana passada, consegui R$ 20 assim. Achei que valeria mais. E por isso tive que fazer uma nova peneira: livros que não foram vendidos na primeira vez, entraram na mochila agora. O homem devolve os meus gibis. Diz que não vende. Escolhe os melhores livros. Uns livros técnicos, coisa de faculdade. Oferece R$ 15. Aceito. Se descontar os gastos com a passagem de ônibus, são R$ 11. O homem não sabe que quero ir pra Brasília, não sabe o preço da passagem. Não sabe que estou me consumindo em pressão – e paixão, perigosa.

Mas não o culpo – eu também, neste momento, não sei uma porção de coisas. Por exemplo: não sei que o amor acaba. Ou que, às vezes, ele não chega nem a existir – e não será por teimosia que ele surgirá. Também não faço ideia de como seja Brasília. E, absolutamente, desconheço o que é viver sozinho nela. Sou apenas um pobre rapaz que agora carrega uma mochila vazia, enquanto volta para casa, preocupado.

Henrique Fendrich
Enviado por Henrique Fendrich em 25/07/2011
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