Outra vez (no dia do escritor)

Outra vez

Pereira Filho

24.07.2011

23:30

Teresópolis-RJ

A vida está dividida em duas partes. O agora e o que foi até há pouco.

Creio assim agora. Vim ao mundo para não fazer falta, e isto me incomoda sobremaneira. Imaginar que talvez não conheça os meus netos e que estes viverão sobre mim, adubo, me desespera. Queria ficar mais um pouco, e a consciência de que o mundo vai continuar quando eu for me faz sentir inútil.

Por isto escrevo.

Já tentei escrever sobre isto algumas vezes. Soa infantil, texto de iniciante que se surpreende com algo bem escrito e quer fazer igual. Mas quer saber? Sou ridículo, sou infantil. Também sou iniciante. Mas eu estou aqui, estou respirando. Enquanto houver respiro haverá recomeços, haverá divisores de água. Haverá textos.

A lembrança mais antiga que tenho me leva aos seis, sete anos de idade. Escrevia em talões de rascunho trazidos por meu pai, e eram poemas para Ermelinda. Ela era a garota mais bonita da sala. Não me recordo dos textos, mas escrevia para ela. Meus pais riam a cada rima que fazia. Mais tarde um pouco escrevi uma carta para o dia dos pais. Citei um problema familiar que hoje é motivo de risos da parte de minha mãe e vergonha para mim. Ainda têm esta carta guardada. Também escrevi uma carta de amor para minha primeira namorada. Tinha três páginas. Escrevi um poema para meu primeiro filho e hoje regresso.

Boa data. Faltam dez minutos para o dia vinte cinco. Dia do escritor. Se não sou profissional ao menos utilizo deste expediente para libertar a mente da prisão de ter que existir fora do meu desejo. Sou isso, para isto nasci. Vou escrevendo e, quem sabe, reencontro a Ermelinda dos meus tempos de criança, em forma de sentido para a vida?

Um feliz dia do escritor a todos os escritores do Brasil.