Figuras de sintaxe

Figuras de sintaxe

(*) Texto de Aparecido Raimundo de Souza.

Micome casualmente encontra Dacongosto na fila do caixa do supermercado. Ao se deparar com ela, corre a cumprimentá-la com um abraço e um beijo no rosto. Entabula conversa:

- Oi chuchu, quanto tempo...!!!

- É Messsssssssmo...! Um bocado! E ai: tudo bem?

- Melhor agora, Da. Chuchu mata uma curiosidade minha: é impressão ou você anda sumida do pedaço?

- Impressão. Todo dia aqui.

- Não tem “aparecido” lá em casa!

- Falta de tempo. Estou com Barbosa, o pedreiro. Ele me aluga o dia inteiro.

- Ué! Não sabia que você havia dispensado o Fuzil...!!!

- De onde tirou essa idéia?

- Ora, Chuchu, você acabou de falar que largou do Fuzil...!!!

- Em absoluto. Lembro ter dito estar com o pedreiro...

-... Ah!... Agora entendi. Imaginei que você mais o Fuzil...

-... Nada a ver, cara. Ficou maluco?

- Desculpa. Quando você mencionou o Barbosa, pedreiro, eu deduzi outra parada... Foi mal!

- Bota mal nisso, meu caro. Acha que eu teria coragem de trocar o meu Fuzil por um pedreiro? Ainda mais o Barbosa! Sabe quem é o Barbosa, não sabe?

- Claro. A galera em peso aqui nas redondezas conhece a figura. Ele andou fazendo uns serviçinhos pra mamãe. Excelente profissional... Nada a reclamar...

- Pois então: contratei o moço pra acabar de tocar a obra.

- Pelo menos agora a coisa anda, Chuchu. O Barbosa é muito responsável.

- Que idéia foi essa de imaginar que eu mandei o Fuzil sumir da área?

- Nunca se sabe Chuchu, nunca se sabe. Vocês, mulheres, são doidas e imprevisíveis. A minha não me deu um pé no traseiro por causa do Barata?

- Fazer o que, né? Vai ver a tara dela é correr atrás de insetos.

- Não entendi a piada!

- Deixa prá lá. Bobeira minha. Fala das novidades que estão rolando...

-... Por enquanto, nada de novo.

- E o escritório?

- Fechei uma parceria com o Zé dos Pirulitos.

- Aquele dos doces?

- Esse messsssssssmo.

- Então você vai passar a vender balas e brigadeiros?

- A idéia é exatamente essa.

- Pensei que ele só comercializasse pirulitos.

- Ledo engano, amiga. O Zé vende de tudo: bananada, amendoim, jujuba, chiclete, chocolate... Enfim, há uma variedade enorme de produtos.

- E por que o apelido?

- Bem, Dacongosto, esse fato não é desconhecido pra ninguém aqui do bairro. Você mesma sabe o motivo da alcunha. Ele anda pra baixo e pra cima com um pirulito enfiado no canto da boca.

- Cuidado, Micome.

- Por quê?

- Você pode gostar do babado e passar a circular com um enterrado entre os dentes. Imagine a cena...

- To fora, Da. To fora! Não gosto de pirulito. Aliás, odeio qualquer tipo de produto que contenha açúcar.

- Explica então como esse foi parar no seu bolso!

Micome se abre num sorriso amarelo. Parece furioso com a observação meio que marota da companheira de periferia. Tenta explicar, sem complicar:

- Quando vinha pra cá, o Zé cruzou comigo. A gente iniciou um papo e ele acabou me dando um pra Tuniquinha.

- Posso fazer uma observação? Você leva jeito pra carregar pirulito no bolso. O papel celofane desse ai combinou com a sua camisa. Sei não...!!!

- Qualé, Dacongosto. Resolveu fazer hora comigo? Sou homem. E macho!

- Mamão é macho e é fruta.

- Sou espada.

- Espada também vive metida em bainha...

- Vamos deixar de lado esse papo furado. Antes que me esqueça: você está enrolando, Da. Que história é essa da minha ex ter me trocado por insetos?

- Bobeira, Micome. Falei pra encher seu saco. Você sabe que gosto muito do Fuzil. Acha que teria peito pra trocar meu namorado?

- Peito você tem... De sobra...!!!

Ambos caem na gargalhada. Dacongosto, todavia, alfineta Micome e observa muito séria:

- Tenho categoria, isso sim. Imagine eu abandonar o Fuzil pelo pedreiro! E pior, logo pelo Barbosa...

-... Sei lá. Vai ver o prumo do Barbosa é mais interessante do que o gatilho do Fuzil...!!!

- Pirou, Micome? Endoidou o cabeção? Deu agora pra viajar na maionese?

- Acha que estou viajando?

- Acho.

- Messsssssssmo?

- Messsssssssmo...!!!

- Vamos almoçar lá em casa? Aproveita que o Fuzil não está por perto...

- Até que não seria má idéia. Porém, pesando os prós e contras, você sabe que o Fuzil é maluco e pode chegar num abrir e fechar de olhos. Já pensou na hipótese dele estar por ai disfarçado de cachorro?

- E qual seria o problema, Da? Vamos supor que ele chegue aqui agora. Imediatamente eu me disfarçaria de pneu de automóvel.

- Chiiiiiiiii...!!! Não iria prestar. Esquece o almoço. Cada um no seu canto.

- Por quê? Me de um motivo justificável.

- Fuzil com certeza puxaria o gatilho e daria uma bela mijada em você.

(*) Aparecido Raimundo de Souza, 58 anos é jornalista.

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Aparecidoescritor
Enviado por Aparecidoescritor em 24/07/2011
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