Eu vou à guerra

É dia de viagem, e tenho a súbita vontade de encontrar pessoas. Quero vê-las e conversar tranquilamente, e depois ficar recordando dentro do avião. É uma maneira de fazer com que me acompanhem. Lá em cima, reconstruirei de novo todo o nosso encontro, e sentirei mais uma vez tudo aquilo que passamos. É bom que tenha acontecido alguma coisa engraçada. Talvez eu diga alguma coisa tão absurda, mas tão absurda, que você dará uma risada solta, e será uma risada tão espontânea que eu, lá em cima, me lembrarei e rirei também, como se você estivesse de novo ao meu lado e fosse feliz.

Quem sabe eu queira ouvir também, no nosso encontro, aquilo que sempre é dito para as pessoas que viajam, e para mim em especial. “Uma boa viagem! Aproveite para comer a comidinha da sua mãe. Ela deve estar com saudade. Quanto tempo faz que você não vai para lá?”. E a tudo eu respondo e agradeço, porque isso me faz bem.

Estou em Brasília há um ano e quatro meses, e quase não consigo viajar para Curitiba – é o trabalho, é a falta de feriados, é o dinheiro que não sobra. Você já viu quanto custa uma passagem de Brasília para Curitiba? É desanimador. Não existe promoção em feriado, Isadora. Em feriado existe apenas gente de todo os cantos querendo viajar para todos os lados. E eu não estou acostumado a viajar, e por isso tenho esses desejos de encontrar pessoas, e de levar comigo as suas melhores imagens.

Irei para uma outra terra, distante, e muito diferente da nossa. Lá ficarei por um tempo interminável – cinco dias. Durante esse período, não verei pessoa alguma de Brasília Largarei toda a minha rotina e passarei a adotar uma outra. É como se eu estivesse indo para a guerra, Isadora. Eu seria como um pracinha, daqueles que saíram do Brasil e foram fazer a guerra na Itália, sabe? As mulheres, as famílias, tiveram que ficar aqui, apenas esperando o dia em que eles voltariam. Só que eles viajaram para fazer uma coisa feia, e eu quero apenas passar uns dias com a minha mãe.

Não, acho que a comparação não serve. Eu só queria dizer, Isadora, que vou estar longe, mas me lembrarei de ti. Ainda no avião eu lembrarei de ti. E quando a guerra terminar, eu volto pra Brasília, a gente se encontra e tudo será como antes.

E então, se Deus quiser, nos casaremos.

Henrique Fendrich
Enviado por Henrique Fendrich em 24/07/2011
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