Desconexão

Sinto-me, muitas vezes, desconecta da vida; uma simples boneca

de pano, esquecida no baú da Eternidade; uma marionete de passos

ensaiados; um ventríloquo de frases decoradas.

Na ânsia da sobrevivência, procuro transformar pequenas surpresas em incalculáveis alegrias, mascarando a inércia de seguir em frente, enfrentando a realidade da vida.

Preciso aprender a viver nesse mundo, entender os mistérios

que rodeiam meus anseios, investigar os encantos camuflados nos

“cantos” da minha existência.

Preciso reconstruir minha vida, desenterrar grandes sonhos, desencaixotar velhos planos, fingir acreditar nas mentiras que ouço e

duvidar das verdades que me são reveladas. Preciso de ar, de cor, de

um sopro de alívio, de um tradutor.

Preciso aprender a conviver nesse mundo, nem que para isso eu tenha que exterminar minhas idéias românticas, minhas revolucionárias ideologias e meus fantasiosos idealismos.

Preciso aprender a conviver com a ambiguidade dos fatos, pois,

aqui, nada é o que parece ser! Em nome do amor, as pessoas nascem,

morrem, protegem e matam.

Em nome da honra, perdem a razão, e em nome da razão, cometem loucuras!

Tenho saudades de um outro mundo, sem mesmo tê-lo conhecido. Sei que ele existe, apenas não está disponível no momento.

Um mundo ao qual quero voltar, sem ter a mínima noção do caminho

que devo seguir. Faço parte desse mundo telúrico, surreal, onde as

pessoas cultivam amizades, presenteiam-se com flores, andam sem

pressa pela rua, trocam confidências e compartilham idéias. Um

lugar onde as crianças têm a liberdade de brincar na chuva, correr

nos campos, subir em árvores, escalar montanhas e desbravar

florestas. Um mundo onde os idosos não precisem enterrar suas

experiências de vida, não se envergonham com a lentidão da marcha.

Às vezes, tenho a nítida impressão que já fiz parte desse mundo.

Fecho os olhos e pareço tocar no seu solo. Em alguns momentos,

numa fração de segundos, meu ritmo perde o compasso e sinto o

desacelerar da vida. Abro os olhos rapidamente, esperando o

impossível. Inútil! Estou parada, exatamente no mesmo lugar, nesse

mundinho real, onde nada acontece além de uma lenta, enfadonha e

previsível rotina.

Esperar que a felicidade venha um dia me visitar? Ilusão. Ouvi

dizer que ela aposentou-se por invalidez. Está vivendo em outro

planeta, sem contato com os humanos e sem compromissos

intermináveis. Está velhinha, a coitada! “Gagá gagá”, estágio

avançado de Alzheimer . Não se lembra nem do próprio nome, muito

menos da sua nobre missão. Logo logo será apenas mais uma

lembrança. Seu significado terá que ser vasculhado nos antigos

dicionários, empoeirados pelo tempo.

Será uma lenda, quem sabe estudada em aulas de Filosofia e

Sociologia, ou talvez “ressuscitada” em alguns poemas da Literatura

Brasileira.

Dizem as más línguas que a Esperança está indo pelo mesmo

caminho. A cada dia mais desacreditada e depressiva, não tem

suportado a idéia de ser eternizada. Anda espalhando, aos quatro

ventos, que até já encomendou a morte do F.D.P. que inventou e

divulgou a famosa frase: “A esperança é a última que morre!!!!!”