DEVANEIOS

Não tenha a menor dúvida, nas linhas retas somente encontraremos o previsível, o conhecido, o comum, o básico, todavia nas tortas certamente descobriremos a surpresa do inédito, o novo inesperado, o incomum que nos surpreende, visões outrora ocultas pelo negro véu do desconhecimento. Percorrer esses caminhos, no entanto, não ficou para todos os homens sensatos, aqueles cujos sonhos ainda estão em construção ou se esgazearam ao longo da jornada da existência.

Os que, às cegas, investem seus devaneios do mais alto valor numa relação sentimental ainda não consolidada, como numa bolsa de valores insegura, nada confiável, esquecendo as infinitas possibilidades, as muitas bifurcações da jornada, os reveses inesperados, os desencontros mais que factíveis, os altos e baixos do coração humano, nem imaginam o quanto podem amargurar-se numa aventura calcada apenas numa paixão repentina e absurda cujo resultado quase sempre é desastroso. Porque há realmente indivíduos assim mesmo, donos de inesgotável sensibilidade amorosa, desses que quanto mais dele se extrai amor mais desse sentimento ele transborda.

Há olhares de desprezo capazes de esbofetear a alma de quem os desafia ou se atreve a passar além da conta nos espaços por aqueles ocupados. De impressionante sutileza, porém profundamente diretos e mortais para as emoções, tais olhares apunhalam, desferem raios perfurantes que chegam ao âmago de qualquer desafeto mais afoito. São venenosos além de qualquer serpente cruel e fria, destroem alegrias, matam vontades, provocam distúrbios psíquicos arrasantes, fazendo estragos até no próprio espírito de quem deles for alvo. Melhor fugir deles, afastar-se o mais rápido possível de sua mira assustadora, ficar definitivamente fora de seu alcance sinistro.

Todavia, há silêncios que explicam e falam no seu mutismo doloroso bem mais além das vozes gritadas, dizem, por vezes, profundidades que os sons jamais pronunciarão. Eles se escondem tanto nos olhares mais afetados quanto nos mais casmurros ou sorridentes. Através desse tanto delinear sem nada clamar, do afirmar sem nem ao menos entreabrir os lábios se percebe um quê de universo pronunciado, de verdades ou sofismas declarados, de angústias, amarguras, melancolias, mas também alegrias e êxtase exclamados. São os silêncios em altos brados perceptíveis nos simples gestos, no menear da cabeça, no alçar dos braços, no bandear de cabelos.

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 20/07/2011
Código do texto: T3106288
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