As relíquias do papai

As minhas relíquias, como posso dizer, são iguais a todas as relíquias de todo mundo, e no geral sem exceções. Menos para meu filho de 3 anos, que sempre que encontra uma dessa relíquias fica encantado, maravilhado, querendo não só pegar, brincar, e sim se apossar de imediato. O tipo de situação que dar um frio na espinha, um medo de estragar algo que foi preservado por anos, e que de um momento para outro pode sumir para sempre. Contudo, surge outro sentimento, um sentimento de orgulho e passividade, chegando a felicidade de poder compartilhar algo que foi nosso, foi, pois a posse é imediata.

Minhas relíquias, como já falei são iguais as de todo mundo, são brinquedos, objetos sem mais utilidade, cartões, revistas em quadrinhos – há minhas Hqs, estão sendo desfolhadas, rasgadas, e ajudando ao meu filho a desenvolver o gosto pela leitura, fico feliz por isso – binóculo, materiais escolares, livros infantis, bem, isso ai tinha que ser dele mesmo. Um dia desses minha mãe me enviou uma sacola com um monte de relíquias, reencontrei – nem sei por que uso esse verbo reencontrar, pois elas sempre estiveram lá, e sempre soube onde estavam – uns pequenos bonequinhos de plásticos, com os personagens da liga da justiça, e um Batman e Robin que eram de outra coleção, mas sem os braços, olhei para aqueles dois brinquedos já tão antigos e tão esquecidos, bem fiz o que tinha que fazer, fiz uma faxina, e separei o que ainda serviam para repassar para Filipe, e joguei no lixo os demais sem mais serventia, o Batman e o Robin foram juntos. Apenas estranhei quando o os vi nas mãozinhas de Filipe, o lixo fora levado e no local ficou os bonecos que logo foram recolhidos pelo pequeno herdeiro.

Assim Filipe vai adquirindo todas as minhas relíquias. Ganhou meu piano de brinquedo com mais de 25 anos de idade, entre outras. São relíquias, sim, para mim me fazem recordar de momentos únicos que me fizeram felizes. Agora mesmo perdendo minhas relíquias, fico feliz ao vê-las com meu filho, e em breve com minha nova herdeira que já ensaia seus primeiros passos, e que também já sabe dar valor as coisas simples e duradouras, só espero que algumas de minhas ex relíquias durem nas mãos de Filipe a tempo de chegarem as de Débora Sofia.

As crianças se apegam as coisas facilmente, e muitas vezes se desapegam com a mesma facilidade. No entanto fui uma criança que sabia cuidar dos brinquedos simples que ganhava com pouca freqüência, mas que eram dados com carinho pelos meus pais. Hoje procuro ensinar meus filhos os valores com os quais eu cresci. E minha felicidade é plena, pois vejo meus filhos crescendo e cuidando de seus brinquedos com cuidado, não com tanto zelo, afinal crianças não sabem ainda o limite da resistência dos matérias, contudo os estragos são naturais nas brincadeiras, mas o importante é saber que eles além de ganharem minhas relíquias, eles também estão aprendendo conservar e dar calor aos simples brinquedos ao ponto deles se tornarem novas relíquias. E assim todas as relíquias do papai se tornaram as nossas relíquias, e quem sabe um dia serão conhecidas como as relíquias do vovô.