Eternos Namorados

ETERNOS NAMORADOS

Vocês podem não acreditar, mas Teresa e João namoram há mais de quarenta anos. É verdade. Ainda, adolescentes começaram sua linda história de amor. Formavam um lindo casal. Ela com o esplendor e beleza natural da mocidade, corpo alinhado, curvas acentuadas. Enquanto João tinha traços de homem feito, apesar de quase menino, cabeleira cheia e uma musculatura de fazer inveja.

O tempo foi passando. Dois anos de namoro. A chama do amor cada vez mais ardente. Teresa via a hora não conseguir se guardar para a noite de núpcias. Como João não tomava nenhuma iniciativa, ela resolveu insinuar:

- João, acho que está na hora de preparar meu vestido de noiva.

Ele pulou da cadeira espantado, pálido e respondeu:

- Não, Teresa, agora não. Precisamos concluir nossos estudos.

Um ano passou, mais um, mais outro ano e ambos se formaram. O amor entre eles permanecia vivo. Alimentado pelos encontros diários, pela cumplicidade constante entre eles. As intimidades cresciam a cada dia e Teresa resolveu tomar mais uma vez a iniciativa:

- João, acho que devo providenciar logo meu vestido de casamento.

Foi como se algo tivesse espetado o rapaz. Ficando em pé de súbito, respondeu prontamente:

- Não Teresa, preciso arranjar um emprego. Firmar-me profissionalmente.

Ele era uma pessoa competente. Em pouco tempo começou a trabalhar. Juntou um dinheirinho. Comprou um carro. E o amor entre eles permanecia. Almas gêmeas.

Teresa sonhava entrar na igreja ao som da marcha nupcial. E aproveitou a primeira oportunidade para comentar:

- João, vou comprar meu vestido de noiva.

Ele:

- Não Teresa, preciso terminar o tratamento de minha gastrite (crônica).

E sempre tinha uma desculpa: Collor bloqueou a poupança, Fernando Henrique está colocando o funcionário público em disponibilidade, o salário está defasado. E o tempo bom não aparecia, para que essa feliz união se concretizasse.

Ambos eram gozados nas rodas de amigos. Esse casório não sai. Teresa estava cansada de tanta espera. O amor já não tinha mais aquela chama ardente. Mas, os encontros entre eles eram diários. Antes namoravam dentro de casa, sob a vigília de D. Maroca. A santa mãe de Teresa, que hoje está no céu. Nem de lá conseguiu convencer o querido genro a oficializar esse parentesco. Agora, namoram sentados na porta da casa. Costume que nem mais no interior se preserva. Mas todos os dias, às 19:00 horas as duas cadeiras estão juntinhas, esperando o casal.

Mais de quarenta anos de namoro. Uma vida. E todo dia ele faz tudo sempre igual. Chega do trabalho, come alguma coisa, toma banho, perfuma-se e vai namorar Teresa. Trocam algumas palavras, encostam a cabeça um no outro, tiram um cochilinho e despertam com um grito de menino na rua, ou com uma moto barulhenta que passa, e aí ela se levanta vai passar um cafezinho para ele.

Teresa tem consciência que não é mais aquela mulher bonita. Perdeu as formas, musculatura flácida, adquiriu as rugas e os pés de galinha próprio da idade. João por sua vez, ganhou do tempo uma bela cabeleira grisalha, seu abdômen cresceu não se sabe se a custa de cerveja ou mesmo por falta de exercício.

O amor entre eles agora tem um tom diferente. O desejo, a chama ardente é apenas favila. Mas não deixa de ser amor.

Teresa, num dia de saudades recordou os bons momentos vividos nos quarenta anos de namoro. Olhou fotos, leu bilhetinhos apaixonados, relembrou cada presente recebido e enchendo-se de paixão, vestiu a melhor roupa para esperar o namorado. Cheirosa e produzida, aguardava ansiosa a chegada de João.

O beijinho de boa noite. As três palavras trocadas. E antes que ele tirasse a costumeira soneca, Teresa matutava. Casar de noiva eu não quero mais. Perdi a bela cintura para os cortes de um vestido especial. Meus seios já não combinam com um modelito próprio para pessoas mais jovem. Mas ainda é tempo de casar com vestido de noiva ou sem ele. E se pronunciou:

- João, você não acha que está na hora da gente casar?

E João respondeu com muita tranqüilidade.

- Teresa, você acha que ainda tem alguém que queira a gente?

Maria Dilma Ponte de Brito
Enviado por Maria Dilma Ponte de Brito em 05/12/2006
Reeditado em 12/06/2020
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