PRESSÁGIOS E SUPERSTIÇÕES QUE AS AVES CARREGAM

Desde os primórdios da humanidade há muito misticismo e superstição na relação entre o homem e as aves. Na Grécia antiga tal relação chegou ao seu ápice. Tanto que a palavra ave em grego é sinônimo de mensagem, de presságio. Muitas guerras tiveram seu rumo estabelecido pelo voar, pelo cantar, pelo agir de uma ave, que alguém devidamente credenciado, segundo a cultura da época, interpretava. Desde então, nossos amigos emplumados inspiraram (e inspiram) diferentes civilizações antigas e modernas em todo o mundo.

Se essa ligação , digamos, sobrenatural, entre homem e ave é universal, nós do Cerrado não ficaríamos de fora. Cresci ouvindo mitos e superstições a respeito desses bichos. O número de crendices é proporcional ao número de espécies que habitam nossa região.

Quem conhece, ou já esteve viajando em estradas de terra que atravessam o cerrado goiano, sabe que vez ou outra, pode-se encontrar siriemas. Estas aves típicas do cerrado, além de ter o hábito de procurar alimento nas margens e no leito das estradas, se apropriam do caminho dos humanos para ir e vir. Caso você se cruzar com alguma, torça para que ela fuja sempre procurando a margem direita. Pois se o bicho for para a esquerda dá um azar danado.

Também há toda uma atmosfera de azar que envolve as corujas. Uma ave como outra qualquer, que tem o costume de cantar pouco. Segundo a biologia, seu canto, como no restante das aves, tem relação com o período de acasalamento. Ciência não é capaz de explicar os fatos ligados à superstição. Ter uma coruja cantando nas proximidades de sua casa é muito ruim. Segundo os mais velhos e sábios habitantes do cerrado, o bicho anuncia que algum morador das adjacências, ou algum parente próximo do mesmo vai bater as botas.

Há uma ave chamada coan. Ela também é conhecida por macoan. Uma ave de rapina, que vive engolindo cobras e lagartos com prazer. Dificilmente se encontra uma voando por aí, vive mais na espreita. Emite um canto triste, que pode ser ouvido de longe. Gosta de cantar no final do dia, e se não for interrompida, segue noite adentro seu incansável: “macoan! macoan!” Se você se cansar de ouvi-lá cantar, tem um modo infalível de apertar o botão desliga, e ainda por cima, traz ao autor do feito muita sorte. Pegue uma faca e enfie na terra, apontando para o lado que o som vem. O bicho para de cantar logo em seguida e isso te dará sorte. Como sei disso? Era uma coisa que eu sempre fazia quando era criança. É só enfiar a faca que o bicho para de cantar. Se traz sorte mesmo, já não sei, mas não custa nada tentar.

As galinhas do terreiro também devem ser observadas. Elas carregam mais superstição que as outras aves, pois o que se fala por aqui é que foram amaldiçoadas por causa de uma ancestral desmiolada. A dita cuja foi ciscar e espalhar justamente a palha do presépio onde Menino Jesus nasceu. Deve ser por isso que os presságios relacionados às galinhas, são mais negativos do que positivos. Quando duas galinhas brigam, é sinal que vem visita feminina por aí. Se o galo cantar fora do horário considerado padrão, é um mau sinal. Tem até um ditado que trata do assunto: “Galo que fora de horas canta, é

cutelo na garganta!” (melhor é passar um cutelo na garganta do pobre, antes que ele acorde a “galaiada” da vizinhança). A galinha quando entra em casa traz azar. Se alguma do terreiro soltar o gogó e cantar, deve ser extirpada imediatamente. Não se pode mudar a ordem natural das coisas, quem deve cantar no terreiro, pelo menos no mundo animal é o galo, não a galinha. Dizem que o seu canto chama a morte. Mas para isso tem um antídoto: é só cortar a cabeça da pobre cantora e jogar em cima do telhado, que isso espantará a morte. Duro é aguentar o cheiro depois.

Os beija-flores têm um lugar especial. Aqui o bichinho sempre traz sorte e alegria. Dizem que se algum adentrar pela casa é como se a mesma recebesse uma visita celestial. O beija-flor traz consigo muita sorte. Mas para valer, a visita tem que ser espontânea, não vale colocar água doce para atraí-los!

O ritmo das batidas do pica-pau na árvore pode decifrar o sexo de um bebê que estaria para nascer. Superstição muito útil nos tempos a.U(antes da ultrassonografia). Mas tem que ser perto da casa da futura mamãe, se não o passarinho pode se confundir e passar informação errada. Se for um ritmo rápido será menina. Se for mais brando, demorado, será menino.

E os pombos? Não se deixe levar pela imagem bonitinha de pombinhos fofinhos. A prosperidade de seu dono pode ser medida pela quantidade de pombos que possuir. O inusitado que é uma relação inversa. Quanto mais pombos, mais miséria é atraída para o seu proprietário. Em tempos modernos, no qual, os pombos não têm dono e viraram praga, difícil é definir pra onde a miséria vai.

Os urubus são anunciadores de morte por natureza, pois onde há urubu, há carniça! Além do luto eternizado pela cor de suas penas, carregam também a fama de serem almas penadas. Gente que de tão ruim nem o inferno aceitou, volta para cumprir sua penitência em forma de urubu.

Ainda há a crendice que cerca o que entra pela boca, pela carne do pobre do bichinho: pé de galinha, leva a pessoa para trás. Garnizé e pato dão vigor, virilidade. Quero-quero dá insônia (o bicho canta a noite toda, parece não dormir nunca) e o pêru dá prosperidade, sorte.

Todo esse emaranhado de crendices e superstições, existem outras que ficaram de fora não por ser menos importantes. Como eu disse, ouvia isso enquanto era criança, e muita coisa acabei por esquecer. Espero ir lembrando aos poucos, preciso comer carne de galinha da angola, o nosso famoso cocá, dizem que é bom para a memória.

Meire Boni
Enviado por Meire Boni em 15/07/2011
Reeditado em 15/07/2011
Código do texto: T3097022
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