Decepções fazem parte da vida

Tietagem geral para comprovar ao vivo e a cores se aqueles espetáculos de homens (aliados a inteligência e simpatia eram realmente o que demonstravam na TV.)

Gabriel Chalita, por exemplo. É o tipo do cara que deveria ser clonado e seus clones espalhados pelo mundo...

Padre Fábio de Mello: a sensibilidade em pessoa! Tinha todos os livros dele, assistia todos os programas. Mesmo sem ter uma religião definida gostava da forma com que ele utilizava as palavras para estabelecer um conceito.

Enfim, os dois viriam para Bauru naquela noite a fim de divulgarem o livro de dupla autoria, intitulado “Cartas entre amigos”. E lá estávamos nós: a Cris e eu, na expectativa daquelas presenças que nunca apareciam.

Imaginem o que eu tinha nas mãos, ou melhor, dentro da bolsa? Correto quem arriscou dizer: “o meu livro”. Um não... dois! E cada um com uma baita dedicatória!

Enquanto esperava a chegada dos dois autores, ficava matutando uma forma de distrair todos aqueles padres, coroinhas e afins para entregar o meu livro a eles. Nenhum dos planos que eu arquitetasse poderia, enfim, dar certo. Mas como a esperança é a última que morre, entreguei meus desejos nas mãos do destino e aquietei meu coração.

A Cris, só sabia repetir: “calma aí coleguiinhaaaa, não dá nada não. Guenta firme, que eu darei um jeito.”

Eu, como já estou acostumada com as suas maluquices, deixei quieto mesmo! A igreja estava simplesmente lotada. Eu e a Cris conseguimos arrumar um lugarzinho ao lado do altar, ali, no chão mesmo. Depois de mais de uma hora de atraso presenciamos a entrada do Gabriel Chalita. A simpatia em pessoa. Humilde, simples e sociável, achou graça da quantidade dos flashes que iluminavam o seu rosto. Ele, como era de se esperar e diante de toda sua sabedoria, entendeu que estava ali para divulgar um livro, apesar do local escolhido ter sido uma igreja. Proferiu algumas poucas palavras e eis que surge, do nada, o “grande ego” a atravessar o altar. Ao ver o tal padre entrar com aquela arrogância, estranhei um pouco, mas contive meu julgamento precipitado. Ele parecia bem mais baixo do que na TV... bem mais pálido e com o rosto repuxado demais para o meu gosto. Quase um clone do Michael Jackson em versão católica. Mesmo assim, as pessoas presentes começaram a disparar os seus flashes e bater palmas de forma calorosa. Para o meu espanto e, pior, para a minha decepção, o padre, que ali naquele momento não estava presente nem para dar uma benção e nem para proferir um sermão, surtou!!! Talvez tenha esquecido que estava ali apenas para divulgar um trabalho editorial ( que, alias, estava bem longe de ser religioso). Esse homem ficou doido!!! Começou a dar lição de moral em todo mundo, exigiu que parassem com todas as fotos, deixou claro que ele não estava ali para dar autógrafos, muito menos para tirar fotos... e bla bla bla. Fiquei “rosa chiclete” com aquela atitude ridícula do padre estrela. Não só eu, mas a maioria das pessoas que estavam sentadas ao meu redor. Será que o “padre gato”, como é chamado (que aliás, nem é tão gato assim...) pensou que todas as mulheres que estavam naquele local (e eram mais de 80%) estavam loucas para saber da vida e obra dos 12 apóstolos? Ahhh, me poupe! Só na cabeça dele mesmo. Vocês acham que aquele público todo estava presente para ouvir o sermão de um padre ou para admirar o charme de um galã? Quem respondeu a primeira opção, faça uma experiência então: divulgue na imprensa a presença extraordinária de um padre com 90 anos, exímio orador e conhecedor da vida cristã e aguarde o público. No máximo umas duas dúzias de carolas capengas, fazendo hora extra na Terra, aparecerão no evento. Ahhh, para de se enganar seu moço! E outra: concordo que tenha que haver respeito numa igreja, mas quem mandou receber dois autores num local sacro? Qual teria sido a ideia, que eu mesma não consegui entender? Muitas das pessoas que estavam ali, e eu me incluo nessa perspectiva, foram prestigiar o escritor Fábio de Mello e não o padre. E falo mais, se o tal “padre estrelinha” não almejasse fama, aplausos e flashes, deveria ter se limitado a orar e rezar sua missa quietinho no interior do Mato Grosso, bem longe dos holofotes. Não quis cantar? Não quis escrever? Não quis um programa de TV? Não quis usar calça jeans apertadinha... então nenê, aguenta a tietagem! Para com esse papinho torto que mulher tem que se dedicar a arrumar gaveta, fazer faxina e cuidar dos filhos, que isso não está com nada! Você está por fora e redondamente enganado! No meu primeiro livro, elogiei os textos desse autor mas, depois que presenciei ao vivo e a cores, um mocinho de meio metro de altura, engomadinho ao extremo e “asmaticamente” arrogante proferir palavras totalmente sem noção, me decepcionei tremendamente!!! Foi ali, naquele momento que tomei uma decisão, venderia no dia seguinte todos os seus livros para um sebo literário. Afinal, não acredito naquela filosofiazinha fajuta do “faça o que eu falo mas não faça o que eu faço”. O Gabriel Chalita sim é o cara! Ele, com toda a sua simplicidade e humildade, foi a real estrela da noite. Estava quase no final do evento e eu, decepcionada, comecei ajeitar meus livros dentro da bolsa. Resolvi não entregar nada para ninguém. Mas minha amiga Cris é terrível!!! No finalzinho da palestra ela tratou de enfiar os livros embaixo do braço e invadiu o altar. Eu, quase me escondendo no meio das flores, tentava, em vão, me esquivar dos seguranças. Mas nada no mundo fazia aquela doida desistir daquela missão impossível. Com uns oito passos na minha frente, enfrentando a adrenalina de ser barrada no altar, a louca ainda teve a presença de espírito de debochar da minha lerdeza:

- Oooo coleguinha, vamos... rápido... me siga! Vai esperar o quê? Tá parecendo o Tom Hanks: a espera de um milagre??? Dá nada não... vem logo!

Eu tive que parar para rir enquanto a menina maluca seguia em frente. Por fim, ela conseguiu. Driblou os coroinhas, deu um chapéu nos seminaristas e, no momento exato, tratou de puxar um padre pela batina: “Padre, pelo amor de Deus, eu preciso entregar esses livros para os dois moços. É da minha amiga ali ó! É o sonho da vida dela. O senhor tem que me prometer que vai entregar... promete?”

Para ajudar o padre encontrar a tal “sonhadora”, fui obrigada a dar um tchauzinho meio sem graça, no meio daquele bando de coroinhas e seminaristas que me olhavam sem entender absolutamente nada!

Ainda camuflada no meio daquelas samambaias que enfeitavam o altar, sentia tanta vergonha que pela primeira vez na vida, desejei ser teletransportada para o Agreste.

O padre acabou rindo de tamanha loucura, pegando os livros com delicadeza. Prometeu entregá-los assim que terminasse a palestra.

Mas, assim que a Cris percebeu que os dois passariam ao lado dela para sair do altar, resolveu recuperar os livros das mãos do padre e entregá-los pessoalmente aos dois autores. Meu Deus! Eu não podia acreditar no que meus olhos estavam vendo. A Cris, ansiosa, puxava os livros de um lado e o padre, aflito, recuperava-os do outro... uma cena simplesmente cinematográfica! Por fim, o padre venceu o cabo de guerra e ela, sem graça, agradeceu a gentileza e saiu de fininho...

No final do evento, já voltando pra casa, perguntei para minha amiga dentro do carro:

- Cris, será mesmo que esse padre vai entregar os meus livros para eles, hein?

E ela, com as mãos no volante, e fazendo a maior cara de indignação, responde:

-Gilmarinha... hello??? Ele é padre... e padre não pode mentir... ainda mais em cima do altar!!!

Pensei que ela poderia estar certa com essa suposição. Entreguei a minha ansiedade para o Universo tomar conta e rachamos de rir com as nossas aventuras insanas daquela noite!

Tempos depois, meu amigo João Carrara foi para São Paulo participar de um Congresso sobre Avaliação e adivinha quem sentou ao lado dele?

Yes, aquele espetáculo de homem chamado Gabriel Chalita. Conversa vai, conversa vem e meu amigo comentou com Chalita que era de Bauru e que tinha uma amiga que havia lhe presenteado com um livro de crônicas.

Carinhosamente, como sempre, Gabriel comentou:

- Ahhh, você é amigo da Gilmara? Fala pra ela que eu estou lendo o livro, viu?

Nossa... quando o Carrarinha me contou esse fato, quase tive um enfarte do miocárdio. O Chalita citou o meu nome com todas as letras? E ainda disse que está lendo o meu livro???

Uau.... já posso morrer realizada!

Agora, quanto ao “estrelinha de batina”? Que vá cantar... dançar... declamar... escrever... “se achar” e dar sermão bem longe de mim, lá para bandas de Mato Grosso... cara mais grosso!!!!