Todo Cuidado é Pouco
Subindo a Presidente Vargas, pelo lado da sombra, caminhava, com passo levemente gingado, um carioca da gema!
Trajava uma calça branca, talvez uns dois números maior do que o seu manequim, sapatos baratos, mas bem polidos, meias pretas (que se notava pelo balançar das largas bocas da calça), camisa escandalosamente estampada, com os três primeiros botões abertos, deixando à mostra, além do peito cabeludo, um não menos escandaloso (Deus me perdoe) crucifixo prateado, que pendia de um grosso cordão dourado. No dedo anular, o tradicional anelão e ,no rosto, um arremedo de bigode, quase um fiapo de linha! O cabelo, bem lustroso e penteado à capricho, dava o toque final ao nosso amigo.
Apesar da aparência, que quase sempre engana, ele era um trabalhador que "ralava" de verdade, pontual e cumpridor fiel de suas obrigações.
Chamava-se Delfino, mas, se você dissesse esse nome, bem alto e dentro do seu ouvido, lhe asseguro que ele não atenderia; agora, experimente, mesmo baixinho, chamar Fininho e a resposta viria prontamente.
Então, vamos passar a chamá-lo assim e dizer que Fininho morava num distante subúrbio do Rio, além de Deodoro e era para lá, justamente, que se dirigia quando o focalizamos.
Vamos acompanhar o moço e ver o que acontecerá durante esse trajeto.
Quarteirões vencidos e eis que Fininho já se encontra na altura do Ministério do Exército (de cujo serviço fora dispensado por ter pés chatos) e talvez por isso olhasse com um certo despeito para os garbosos soldados da PE que alí fazem guarda.
"milicos folgados" e continua em frente, rumo à Central do Brasil. Alcança a escada e penetra no grande saguão, de impressionante pé-direito, mas que ele jamais notara, e dirige-se à sua plataforma de embarque. com a sempre enganosa esperança de encontrá-la vazia, mas para seu desencanto tudo continuava exatamente igual; um mole de gente a ocupava em seu comprimento e largura.
Ah, iamos esquecendo de dizer que Fininho, como bom carioca, era um paquerador patológico, daqueles que tem o lema de "passou de saia, se não for escocês ou padre, eu encaro".
Vai daí que o trem chega, a turma que veio sai, a porta do outro lado se abre e, então, meu caro, segure-se quem puder e vamos nós. Entre mortos e feridos, graças a Deus, salvaram-se todos e, espremidos dentro do vagão, se arrumam como podem e o que resta é torcer para chegar logo em casa.
Passada a agonia do embarque, os sintomas da velha e genética fixação se apoderam do Fininho e ele olha bem ao redor e, para espanto seu, depara com uma jovem linda, vestida com indisfarçável apuro, distinguindo-a das demais moças, simples suburbanas...
Fininho, mais que depressa, desliza como cobra por entre aquela floresta de braços e pernas e consegue chegar ao lado daquela belezura de menina.
Bem, aí segue-se aquele ritual velho conhecido; primeiro um tossezinha como a dizer "estou aquí", depois um comentário sobre o tempo, a precariedade do sistema de transportes, a última novela da TV, para, em seguida, tentar uma abordagem mais nos moldes dos velhos piratas; gancho nela!
Nessa altura, o trem já estava prestes a alcançar Realengo, onde se situa a Vila Militar, que abriga diversas unidades militares de consagrada projeção, como, por exemplo, o 2° Regimento de Infantaria, o Dois de Ouro, onde, orgulhosamente, serviu este que vos escreve .
Dentro do trem a reação da linda menina não poderia ser outra; ultrajada pelo gancho mal atirado pelo pirata, ela botou a boca no trombone e desancou o pobre coitado, que apanhado no contrapé, nem pode reagir.
Chega o trem à estação de Realengo, abrem-se as portas e, de cambulhão saem o Fininho e a bela menina, ainda furiosa, ameaçando partir para a agressão pura e simples.
Foi a conta; os soldados de guarda, atraidos pelo alarido, identificaram, imediatamente, a graciosa donzela e, alvoroçados, exclamaram: - É a dona Virginia, a neta do General!
Ouvindo isso, o nosso Fininho gelou e pensou "tofú, sujou, irmão" e não deu outra; carregado pelas axilas, entre dois enormes soldados, com os pés fora do chão, foi levado para o quartel do Regimento.
O velho general, ao saber do acontecido, como primeira reação, sacou da sua 45 e partiu para eliminar o meliante, mas, graças à oportuna intervenção do seu fiel conselheiro, desistiu do insano intento.
De tudo isto, caro leitor, o que restou, pelo que pude apurar, é que o Fininho foi compelido a lavar todos os banheiros da unidade e, ainda, passou pela barbearia e teve, raspados à zero, o lustroso cabelo e o fiapo de bigode.
Subindo a Presidente Vargas, pelo lado da sombra, caminhava, com passo levemente gingado, um carioca da gema!
Trajava uma calça branca, talvez uns dois números maior do que o seu manequim, sapatos baratos, mas bem polidos, meias pretas (que se notava pelo balançar das largas bocas da calça), camisa escandalosamente estampada, com os três primeiros botões abertos, deixando à mostra, além do peito cabeludo, um não menos escandaloso (Deus me perdoe) crucifixo prateado, que pendia de um grosso cordão dourado. No dedo anular, o tradicional anelão e ,no rosto, um arremedo de bigode, quase um fiapo de linha! O cabelo, bem lustroso e penteado à capricho, dava o toque final ao nosso amigo.
Apesar da aparência, que quase sempre engana, ele era um trabalhador que "ralava" de verdade, pontual e cumpridor fiel de suas obrigações.
Chamava-se Delfino, mas, se você dissesse esse nome, bem alto e dentro do seu ouvido, lhe asseguro que ele não atenderia; agora, experimente, mesmo baixinho, chamar Fininho e a resposta viria prontamente.
Então, vamos passar a chamá-lo assim e dizer que Fininho morava num distante subúrbio do Rio, além de Deodoro e era para lá, justamente, que se dirigia quando o focalizamos.
Vamos acompanhar o moço e ver o que acontecerá durante esse trajeto.
Quarteirões vencidos e eis que Fininho já se encontra na altura do Ministério do Exército (de cujo serviço fora dispensado por ter pés chatos) e talvez por isso olhasse com um certo despeito para os garbosos soldados da PE que alí fazem guarda.
"milicos folgados" e continua em frente, rumo à Central do Brasil. Alcança a escada e penetra no grande saguão, de impressionante pé-direito, mas que ele jamais notara, e dirige-se à sua plataforma de embarque. com a sempre enganosa esperança de encontrá-la vazia, mas para seu desencanto tudo continuava exatamente igual; um mole de gente a ocupava em seu comprimento e largura.
Ah, iamos esquecendo de dizer que Fininho, como bom carioca, era um paquerador patológico, daqueles que tem o lema de "passou de saia, se não for escocês ou padre, eu encaro".
Vai daí que o trem chega, a turma que veio sai, a porta do outro lado se abre e, então, meu caro, segure-se quem puder e vamos nós. Entre mortos e feridos, graças a Deus, salvaram-se todos e, espremidos dentro do vagão, se arrumam como podem e o que resta é torcer para chegar logo em casa.
Passada a agonia do embarque, os sintomas da velha e genética fixação se apoderam do Fininho e ele olha bem ao redor e, para espanto seu, depara com uma jovem linda, vestida com indisfarçável apuro, distinguindo-a das demais moças, simples suburbanas...
Fininho, mais que depressa, desliza como cobra por entre aquela floresta de braços e pernas e consegue chegar ao lado daquela belezura de menina.
Bem, aí segue-se aquele ritual velho conhecido; primeiro um tossezinha como a dizer "estou aquí", depois um comentário sobre o tempo, a precariedade do sistema de transportes, a última novela da TV, para, em seguida, tentar uma abordagem mais nos moldes dos velhos piratas; gancho nela!
Nessa altura, o trem já estava prestes a alcançar Realengo, onde se situa a Vila Militar, que abriga diversas unidades militares de consagrada projeção, como, por exemplo, o 2° Regimento de Infantaria, o Dois de Ouro, onde, orgulhosamente, serviu este que vos escreve .
Dentro do trem a reação da linda menina não poderia ser outra; ultrajada pelo gancho mal atirado pelo pirata, ela botou a boca no trombone e desancou o pobre coitado, que apanhado no contrapé, nem pode reagir.
Chega o trem à estação de Realengo, abrem-se as portas e, de cambulhão saem o Fininho e a bela menina, ainda furiosa, ameaçando partir para a agressão pura e simples.
Foi a conta; os soldados de guarda, atraidos pelo alarido, identificaram, imediatamente, a graciosa donzela e, alvoroçados, exclamaram: - É a dona Virginia, a neta do General!
Ouvindo isso, o nosso Fininho gelou e pensou "tofú, sujou, irmão" e não deu outra; carregado pelas axilas, entre dois enormes soldados, com os pés fora do chão, foi levado para o quartel do Regimento.
O velho general, ao saber do acontecido, como primeira reação, sacou da sua 45 e partiu para eliminar o meliante, mas, graças à oportuna intervenção do seu fiel conselheiro, desistiu do insano intento.
De tudo isto, caro leitor, o que restou, pelo que pude apurar, é que o Fininho foi compelido a lavar todos os banheiros da unidade e, ainda, passou pela barbearia e teve, raspados à zero, o lustroso cabelo e o fiapo de bigode.