Amigos genéricos

Estava, dia desses, lendo Danuza Leão, quando identifiquei–me com um trecho do seu livro “Quase Tudo”. Dizia assim: “...tempo depois de ter largado o Hippo, fui abrir a agenda de telefones e não encontrei o nome de um único amigo. As amizades da noite duram até o dia amanhecer e se sobrou alguma coisa daquela época, foi à lembrança de algumas risadas e muitos arrependimentos. E só.”

Fiquei pensando sobre esse fato. Passei por vários momentos parecidos sem me dar conta de tal gravidade. Nas épocas de “safra”, minha casa vivia lotada de amigos e meu telefone tocava tanto que era preciso, muitas vezes, retirá-lo da tomada. Escolhíamos os convites mais interessantes para marcar presença. Eu defendia, com unhas e dentes, meus supostos amigos, assumindo todos os problemas para amenizar o encargo de outros, mas, tempos depois, cadê os nomes desses amigos na tal da minha agenda? Cadê o som do telefone insistente? E as cartas, os convites? Sumiram do nada. É Danuza, não são apenas as amizades da noite que desaparecem, são as do dia, da tarde, da madrugada, da vida! E se, particularmente, tenho alguns arrependimentos dessa época, o maior deles é ter atribuído tanto valor em amizades genéricas, sem a mínima importância. Grande engano quando pensamos reconhecer os verdadeiros amigos, sabem porquê? Porque os amigos verdadeiros não aparecem de vez em quando, para serem reconhecidos. Os verdadeiros amigos estão sempre por perto, ao nosso lado. Não tão presentes, na luz dos holofotes, mas iluminando o breu dos becos por onde nos aventuramos passar. Estão presentes no silêncio, na solidão, no final das festas e das gargalhadas. Amigos não tão generosos nos elogios que recebemos, mas infinitamente solidários nas críticas que somos vitimados. Amigos não tão animados nas baladas, mas sabiamente fortalecidos na luta, sorrindo-nos na plateia e chorando nas desclassificações inevitáveis da nossa vida. Amigos verdadeiros são raros. Quase nunca falam o que desejamos ouvir mas quase sempre o que precisamos escutar. A sinceridade das suas palavras não são diagnosticadas pela intuição, mas pela validação dos seus atos, que jamais esperam agradecimentos ou reconhecimentos.

Nessa vida já me decepcionei com muitos “amigos genéricos” e, talvez por isso, hoje eu saiba analisar muito bem a “bula” invisível que cada amigo trás consigo além da “embalagem”, pois as reações adversas costumam ser irreversíveis.