MATEI e MATARIA de NOVO!

Foi em Goiás. Garimpo de Esmeraldas de Santa Teresinha de Goiás.

Desde que cheguei ao tal garimpo onde passei a conviver e aprender a me encaixar em outra cultura, outro mundo, outros valores, ganhei o apelido de "Galega".

Era jovem e mesmo usando roupas largas e masculinas para não marcar as curvas do corpo jovem e bem cuidado, atraia olhares indesejados.

E veio este homem... Ouro nos dentes, facão de um lado da cintura, uma pistola do outro. Me comeu com os olhos desde a primeira vez que nos cruzamos no trecho (local onde os garimpeiros trabalham coletando suas esmeraldas após lavar e extrair do xisto que as abriga e comercializando em espécie de feira livre entre barracões e mal arranjados puxados de lona, - plástico preto -, que serve até mesmo de teto para temporárias moradias). Foi assim... Ao me ver cismou comigo e passou a me seguir. Consegui me desvencilhar ano após ano. Encontro após encontro.

Ele se mantinha sempre afastado. Observava-me de longe como uma onça pintada cercando sua presa.

Eu sabia que corria perigo e sabia o que ele tencionava fazer comigo.

No garimpo estrupo acaba em morte. Ou morre a vítima, ou o algoz vingado pelos parentes da ofendida e violada.

Éramos apenas eu e meu marido e o combinado era: se um dos dois morresse o outro pegaria o primeiro ônibus de volta pra capital. Sairia da mira de qualquer investida que pudesse virar mar de vingança.

Aquele homem me apavorava. Tinha mais medo por meu marido que por mi e jamais contei a ele o que se passava. Precavia-me como podia... Sempre armada que ninguém por lá andava sem uma arma na cintura. Questão de sobrevivência! Só quem viveu ou já assistiu muitas reportagens de locais como este para entender o que digo.

Um dia em que o combinado entre eu e meu marido era que se ele não voltasse até as 17 horas eu fosse embora, me apavorei. Perdi o controle. Passava de 01:00 da manhã do dia seguinte e nada dele voltar.

Resolvi ir até a mina em que trabalhava. Coloquei meu 32 com cabo de madrepérola na cintura e fui. A estradinha era uma alameda cercada por matagal por todos os lados. Tive medo. Sequer lembrava do homem que por vezes me rodeava, sondava, seguia... Segui! Minha preocupação era com meu marido e a vida dele.

De repente, o maior de todos os sustos de minha vida:

- Agora te peguei, Galega!

Era ele. Mesmo na escuridão soube que era ele! O dente de ouro brilhou ao lançar sobre ele o foco da lanterna que também carregava.

A mão dele no facão.

A minha na arma.

Pulou pra cima de mim e num salto pra trás me desvencilhei do abraço certamente mortal. Ele não me deixaria viva pra contar o ocorrido. Eu tinha amigos influentes e nada "bondosos" ou tolerantes e ele sabia disto!

No salto que dei atirei.

Atirei de novo e atirei pra matar.

Aí já era questão de manter-me em segurança e a meu marido também.

Não podia deixar um moribundo viver e voltar para terminar o serviço por vingança.

Descarreguei toda a munição sobre ele.

Meu coração parou.

Após o barulho dos tiros nenhum som no breu da madrugada.

Cheguei perto e chutei o corpo estendido entre a trilha e o mato.

Estava morto.

Não lamento e a própria Lei seria minha aliada se lá se fizesse presente.

Não lamento... Era eu ou ele. Optei em instinto animal por mim.

Não raciocinei como pode parecer.

Não premeditei como podem supor.

Apenas deixei valer a vontade de permanecer viva e intacta.

Se rezo por ele? Não.

Se me incomoda o ocorrido? Não.

Se pudesse voltar atrás faria diferente? Não.

Só quem viveu em um garimpo violento e sem lei sabe do que falo e de minha escolha em não ter qualquer aperto no peito ou na alma para enganosamente arrepender-me do que fiz.

Fiz e faria de novo, mas não farei.

Nunca mais viverei em lugar onde os bichos selvagens são mais mansos e cordiais que os "humanos" ali viventes!

Garimpos? Já sei o que são pra nunca mais.

by MarCela Torres

MarCela Torres
Enviado por MarCela Torres em 10/07/2011
Reeditado em 11/07/2011
Código do texto: T3086038
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