Nota de falecimento
1. Ponho numa pastinha vermelha o que recorto nos jornais e nas revista. Para que servem esses recortes? Diria que eles me ajudam a cronicar, reavivando-me a memória septuagenária.
Não faz muito tempo, fui buscar, num recorte de mil novecentos e sessenta e tantos, um fato narrado por Henrique Pongetti.
Desse dado eu precisava para terminar uma crônica que me exigia um inevitável retorno ao passado.
Graças a esse recorte - pela ação do tempo já começando a amarelar -, fui fiel ao me referir a um acontecimento remoto (e bote remoto nisso) retratado, com segurança e perfeição, pelo maravilhoso Pongetti, jornalista e dramaturgo, morto em 1979.
2. Noutra ocasião, escrevendo sobre música popular brasileira, recorri a recortes com opiniões abalizadas do repórter Davi Nasser, morto em dezembro de 1980, e do cronista e compositor Antônio Maria, morto em outubro de 1964, no calçadão de Copacabana, deixando-nos a canção "Ninguém me ama". Foi o bastante para dar à minha página consistência e irrecusável credibilidade.
3. Assuntem só: sou tão ligado em recortes de jornais e revistas que até as "Notas fúnebres", noticiando a morte de pessoas ilustres e de amigos do peito, eu as destaco e as guardo nas entranhas de livros religiosos que já li. Quando menos espero, deparo-me com uma nota de falecimento de um conhecido morto há muitos anos, reacendendo, neste cronista, lembranças saudosas e gratificantes...
4. Minha mania por recortes de jornais e revistas já é do domínio público! Por isso, vez em quando, amigos me mandam, em envelopes lacrados, esses retalhos de notícias, pedindo que eu os coloque na minha pastinha vermelha. Faço-o sem abrir os envelopes e sem perguntar o porquê de tamanha confiança e fraternal gentileza.
5. Recentemente, uma parenta morreu, e, no seu Codicilo, deixou para mim uma sacola bem fechadinha. Abri a dita cuja, e encontrei, bem catalogado, recortes de jornais dos anos 1950-60, todos da maior importância; raridades, inclusive.
6. Dia desses, sobrando tempo, resolvi abrir um envelope que recebera em março de 2011, destinado ao aniversariante do mês. E qual não foi a minha surpresa ao encontrar um recorte de jornal noticiando a minha morte! Foi uma brincadeira, claro. Encarei-a, por isso, com naturalidade.
7. Mas o leitor nem pode imaginar a sensação que senti figurando em uma nota de falecimento. Me vi, por alguns instantes, no outro mundo.
Certo de que isso, hoje ou amanhã pode acontecer, guardei o gaiato recorte fúnebre, e chorei com saudade daqueles que um dia terei que dar um "tchauzinho!"... definitivamente.
1. Ponho numa pastinha vermelha o que recorto nos jornais e nas revista. Para que servem esses recortes? Diria que eles me ajudam a cronicar, reavivando-me a memória septuagenária.
Não faz muito tempo, fui buscar, num recorte de mil novecentos e sessenta e tantos, um fato narrado por Henrique Pongetti.
Desse dado eu precisava para terminar uma crônica que me exigia um inevitável retorno ao passado.
Graças a esse recorte - pela ação do tempo já começando a amarelar -, fui fiel ao me referir a um acontecimento remoto (e bote remoto nisso) retratado, com segurança e perfeição, pelo maravilhoso Pongetti, jornalista e dramaturgo, morto em 1979.
2. Noutra ocasião, escrevendo sobre música popular brasileira, recorri a recortes com opiniões abalizadas do repórter Davi Nasser, morto em dezembro de 1980, e do cronista e compositor Antônio Maria, morto em outubro de 1964, no calçadão de Copacabana, deixando-nos a canção "Ninguém me ama". Foi o bastante para dar à minha página consistência e irrecusável credibilidade.
3. Assuntem só: sou tão ligado em recortes de jornais e revistas que até as "Notas fúnebres", noticiando a morte de pessoas ilustres e de amigos do peito, eu as destaco e as guardo nas entranhas de livros religiosos que já li. Quando menos espero, deparo-me com uma nota de falecimento de um conhecido morto há muitos anos, reacendendo, neste cronista, lembranças saudosas e gratificantes...
4. Minha mania por recortes de jornais e revistas já é do domínio público! Por isso, vez em quando, amigos me mandam, em envelopes lacrados, esses retalhos de notícias, pedindo que eu os coloque na minha pastinha vermelha. Faço-o sem abrir os envelopes e sem perguntar o porquê de tamanha confiança e fraternal gentileza.
5. Recentemente, uma parenta morreu, e, no seu Codicilo, deixou para mim uma sacola bem fechadinha. Abri a dita cuja, e encontrei, bem catalogado, recortes de jornais dos anos 1950-60, todos da maior importância; raridades, inclusive.
6. Dia desses, sobrando tempo, resolvi abrir um envelope que recebera em março de 2011, destinado ao aniversariante do mês. E qual não foi a minha surpresa ao encontrar um recorte de jornal noticiando a minha morte! Foi uma brincadeira, claro. Encarei-a, por isso, com naturalidade.
7. Mas o leitor nem pode imaginar a sensação que senti figurando em uma nota de falecimento. Me vi, por alguns instantes, no outro mundo.
Certo de que isso, hoje ou amanhã pode acontecer, guardei o gaiato recorte fúnebre, e chorei com saudade daqueles que um dia terei que dar um "tchauzinho!"... definitivamente.