Casamento, traição e convivência

“Casamento” é o assunto favorito dos principais cronistas brasileiros. Muitos o tratam com uma doença contagiosa, cujo o único remédio eficaz é o divórcio. Concordo com o conselho quando um dos cônjuges é um verdadeiro chato. Existem “casamentos” e “casamentos”. Tenho um amigo que se gaba 24 hs por dia do seu casamento, mas ao lado da esposa (que é uma chata) muda totalmente o seu comportamento habitual. Fica exatamente como ela: um purgante. O cara, longe da “mala”, é um amigo extremamente especial: engraçado, leve e light. Do lado da “mala” é um chato de galocha: não ri das nossas palhaçadas, usa guardanapinho para comer churrasco, pensa mil vezes antes de dar uma opinião, leva tudo ao pé da letra, enfim, parece um babaca sem personalidade. A mulher dele, por sua vez, sem um gato pra puxar pelo rabo, se acha a rainha da cocada preta. Esnobe, chata e extremamente indesejável. O que leva um cara assim ter uma vida dupla com a própria esposa? Tá na cara que eles não são felizes, mas o slogan do casamento perfeito é levado a sério. Não brigam, não fumam, não bebem, não se divertem, não vivem! Imagino a transa... que coisa mais sacra! Aí analiso o meu relacionamento. Um turbilhão de emoções, de choros, de risos, de sensações inebriantes. Passamos fome, mas nos alimentamos de coragem. Passamos vontade, mas nunca desistimos da luta. Somos um só, longe ou perto. Falamos, rimos e gostamos das mesmas coisas, estando distantes ou próximos. Nada de “não me rele não me toque”, pelo contrário. Quando brigamos, a coisa pega fogo! Quando fazemos as pazes, idem.

Enfim, nada melhor do que um relacionamento tumultuado. Excesso de tudo. Excesso de brigas, de amor, de sexo, de proteção, de bobagens, de planos, de loucuras. O bom humor sempre povoou minhas histórias e talvez por isso, ela seja tão interessante e tão imprevisível! Sou adepta a gargalhadas, na alegria e na tristeza. Sou favorável a prática de loucuras saudáveis. E nessas sandices, posso incluir: danças exóticas em pleno carro em movimento, escapadas pela madrugada a caça de morangos com chocolate e sorvete de abacaxi, varar a noite se “entupindo” de foundi com vinho branco, desfiles de calcinhas (pra lá de ridículas), usando a cama como palco... Nem me importo com o fantasma do peso ideal. Sei que além de não ter mais vinte aninhos, estou acima do meu peso mas, e daí? Tratando-se de jogos de amor, o que conta é o clima, o feeling, as insinuações... e não as medidas! Sambar na pontinha do pé (ao som da bateria da Mangueira) sem se importar se os passos estão, ou não, adequados deixa qualquer homem doido. Provocá-lo com olhares insinuantes, fazendo movimentos sensuais com a boca enquanto sorve uma taça de vinho tinto é o mesmo que convidá-lo a parar com a cerveja, afinal, algo bem melhor está por vir. Não há nada melhor que vê-lo “desconsertado”, sem poder explicar aos amigos o real motivo de ter parado com os chopps e pedido uma coca-cola. Um dia, após uma briga homérica com meu namorado, quase deixo o coitado em coma de tanto rir quando encarno o Michael Jackson e resolvo segui-lo pela casa inteira ao passo de Thriller, até conseguir o que eu queria, nesse caso era convencê-lo a preparar o almoço de domingo para quinze amigos que havia convidado para passar o dia. Nada mais gostoso do que promover um mega pic nic no chão da sala, assistindo “Eu, a patroa e as crianças” e chorar de rir com as tiradas dos pequenos. E por que não, na “hora h”, surpreendê-lo com um sonoro “UUUrrrrrhhhhuuuu” quando a coisa tiver pegando fogo, ou tremendo no pico da neblina? Homem adora declarações sexuais explosivas... pelo menos o meu adora! No meu caso, até tolero que ele salgue os olhos numa rápida admiração do sexo oposto. Quando a guria realmente é bonita, que mal tem? Olhar arranca pedaço? E quando alguma moçoila atrevida dá uma olhadinha pra ele? Não encano. Se a investida for discreta, finjo que nem vejo. Na boa. Afinal, que mal tem deixá-lo curtir um pouquinho da indescritível sensação de ser desejado por outros olhos, por outras bocas, por outras vidas? Vai me dizer que quando as luzes se apagam, a fantasia não se apossa da nossa santa lucidez? Ahhh, como diz Martha Medeiros, somos muito mais doidas do que santas! E vamos combinar? Vamos parar com esse negócio de hipocrisia, de puritanismo e de frescuras do século IX ? Somos compromissadas, mas bem longe de estarmos mortas! E sem esse blá blá blá de não estar mais na idade, de estar fora do peso e o escambal. O erotismo não está no corpo, mas no jeito, na sintonia, na “desencanação”. Não estou falando de ser amada, mas da sensação de sentir-se desejada. Todo ser humano que se preze precisa disso. Não que sairemos por aí arrumando amantes... mas que o clima de sexo proibido nos excita, não há dúvidas. Uma vez meu namorado me perguntou se eu tinha VONTADE de transar com outro homem. Respondi: Jamais teria CORAGEM de fazer isso, mas VONTADE tenho sim. Ele ficou uma “onça”. Ué, quem mandou perguntar? Lógico que eu tenho vontade, toda mulher tem! E se falar que não, além de safada é mentirosa! E ele que dê graças a Deus que eu não tenho coragem de pular a cerca, sendo que a maioria das mulheres que eu conheço, tem. E pulam! Mudaria esse meu pensamento sobre “coragem” e essa minha resposta de “jamais” só em uma condição. Se a tal proposta partisse dos lábios do Richard Gere... aí, minha amiga, compraria essa tal coragem rapidinho, ou no mercado negro ou das mãos de qualquer cambista que cruzasse o meu caminho. E vai me dizer que se as divas do cinema dessem mole, nossos maridos não protagonizariam uma cena de sexo selvagem com elas!!! Aahhh, eu me queimaria viva na fogueira se, nesse caso, os safados negassem fogo! Tenho ao meu lado um homem maravilhoso mas não com um ser divino. Sabe o que eu, realmente, acho? A traição não se consolida somente no sexo. A traição está além disso. Um sorriso mal intencionado, um olhar mais que insinuante, um beijo no rosto intencionalmente molhado... são atitudes que traem. Um pensamento trai. Uma fantasia trai. Olhar-se no espelho e desejar ser admirada por outros homens é uma traição... uma traição light... mas é uma traição. Ou não é ? Numa escala de 0 a 10, a traição sentimental alcança o nível 9. Já a traição sexual, ficaria na média 4. Teria muito mais ciúmes se eu percebesse que meu marido não consegue tirar uma outra mulher do seu pensamento do que se eu descobrisse que ele teve uma única noite de sexo com ela. A noitada acabou ali, já a imagem dela do seu pensamento o acompanha em todos os momentos do seu dia, em todos os segundos da sua noite e dos seus sonhos. Mas enfim, estar acompanhada tem lá suas inúmeras vantagens. Temos companhia, amizade , cumplicidade, sexo e carinhos garantidos. Temos alguém para colocar meias nos nossos meus pés gelados e cobrir nossas costas quando adormecemos no sofá da sala. Temos alguém para dividir nossas angústias, nossas alegrias, nossas expectativas, nossas frustrações. Temos alguém para lembrar da hora de tomarmos o remédio da gripe, de desligar a costela no forno, de alcançar a toalha no banho. Temos alguém pra rir das nossas palhaçadas, chorar com nossas dores e sorrir das nossas infantilidades...

Eu tenho esse alguém do meu lado, que é inteligente o bastante para entender as minhas mancadas e tolerante o suficiente para compreender a minha ansiedade em resolver os problemas do mundo.

Tenho alguém que me acorda com um beijo, que me coloca na cama com outro e me seduz com muitos desses.

Liberdade?

Quem precisa dela?

Sei pensar. Sei imaginar. Sei fantasiar...

O resto eu deixo estar!!!