AS FACES DE EVA
Ser mulher dentro da mulher que preciso ser é ao mesmo tempo apresentar uma em múltiplas faces. Não é fácil lidar com isso, sem desejar um disfarce para aliviar o peso de carregar tantas mulheres dentro de mim. É estranho pensar assim, mas me recordando um filme antigo que vi há muito tempo atrás, “As três faces de Eva”. Filme este, inspirado na história real de Chris Costner Sizemore, uma pacata dona de casa, depressiva, que possui 3 personalidades completamente diferentes dentro de si, e que ao longo dos anos revelou outras tantas.
Em 1957, no filme, esta personagem é Eve White, que ao ser levada pelo esposo ao psiquiatra, tem o diagnóstico de trazer dentro de si a existência de outros álteres (outras duas personalidades distintas, Eve Black e Jane). Trata-se, de um distúrbio pouco conhecido na época, chamado Distúrbio de Personalidade Múltipla, hoje conhecido como DDI – Distúrbio de Dissociação de Identidade.
Depois desse rápido mergulho histórico que Titio Google me proporcionou como alicerce às minhas lembranças, volto às implicações adjacentes que a narrativa me permite.
Embora o filme enfoque o caso de um distúrbio mental, eu, fazendo um gancho na realidade estressante que a vida moderna tem nos imposto, obrigando-nos a assumir papéis diferentes e diversos (de mãe de seus rebentos que precisam de sua plena atenção, esposa/dona de casa dedicada do marido que não abre mão de seus zelos domésticos; da profissional competente que não pode errar, pois se erra é porque é mulher; da esposa/amante, que tem que estar bonita, sexi, perfumada e bem disposta, porque se assim não for, o marido vai buscar outra que a substitua;...).
Ser mulher é portanto, nos multiplicar em várias e nos esforçar para ser total em cada uma delas, porque os filhos, o patrão, o esposo/amante, nós mesmas nos queremos por inteiras e a disputa das “Evas” existente dentro de nós é desgastante. E, querendo ou não, na realidade, uma sempre vai deixar a desejar e as cobranças da sociedade, da família, de nós mesmas são uma inevitável consequencia.
Só que ninguém é perfeito, e a Diana, a “Mulher maravilha”, só existe nos desenhos da Marvel. E mais, se nem mesmo a primeira Eva da história da humanidade foi perfeita, por que nós, as modernas deveríamos ser? Ainda dizem as teorias pagãs, que antes de criar a Eva edênica da costela de Adão, Deus havia criado outra mulher do mesmo pó da terra que havia feito seu parceiro, esta se chamava Lílith. Porém ela causara tantos problemas que foi banida do Éden.
Vendo o homem só e infeliz, Deus se compadeceu e voltou a criar, mas não do pó, agora da costela de Adão, para que ela nunca viesse querer ficar acima dele, como Lílith tentou, e nem tampouco ele viesse a tentar colocá-la abaixo de si... e deu-lhe o nome de Eva... e esta ser-lhe-ia por auxiliadora.
Auxiliadora, sim, “A U X I L I A D O R A” ... Quem auxilia não decide, ajuda a decidir; não manda, não faz, compartilha da ação. Pois bem, Eva auxiliou a decisão de Adão em comer o fruto proibido e pagou com a sentença de parir as dores do mundo, e carregar a culpa do pecado original... eis aí o início do dilema da mulher...
Não creio que Deus tenha errado na criação da mulher, e por isso teve que fazer de novo, mas a Lílith do pensamento pagão é uma outra face da Eva que existe em cada uma de nós, a que desejou, ambicionou o fruto proibido e foi sagaz, ousada em convencer o fraco e omisso Adão em segui-la neste feito. A Eva edênica, criada por Deus (auxiliadora) é o equilíbrio, o ego personificado; a Lilith (outra face de Eva) é nosso id, que traz todas as nossas punções ao “pecado”, a carga da libido que nos faz querer ser além do que devemos ser, do que é permitido ser, que nos impulsiona consciente ou não a realizar nossos mais terríveis desejos.
E vem a sociedade (Eva matrona, moral), o superego, e diz: “você não pode”, coloque-se mulher em seu lugar de: mãe, esposa, profissional, filha,... e nesse ínterim, nos vestimos da máscara que a sociedade oferece em cada situação e vão se multiplicando as faces de Eva em nós...
Agora eu pergunto: você é normal? Quantas Evas há dentro de você, mulher?...
(Irene Cristina dos Santos Costa – Nina Costa, 07/07/2011)