Reminiscências de minha Casa Amarela
O bairro de Casa Amarela era tranqüilo, o trem da Great Western passava na então estrada de ferro norte (hoje Av. Norte) com o apito saudoso da Maria Fumaça que soltava fumaça em desenhos, através de sua chaminé, deixando pela linha afora um cheiro saudoso do carvão-de-pedra e o bonde da Tramways pela Estrada do Arraial no seu delengue-dengue.
Pelas manhãs vinham o pãoseiro, o leiteiro, o verdureiro, o seu coceiras, o amolador de facas e tesouras, o miudeiro, o gazeteiro etc. À tarde, esquentava, vinham diversos vendedores com seus produtos. À noite, o movimento aumentava, era festa de rua, os namoros nos campos de futebol do Ypiranga, Canto da Vila, Joca Leal, Boi da Merda, Tramways, Belveque, Baixa Verde.
Nós íamos assistir aos filmes nos cinemas Rivoli, Casa Amarela (mais conhecido por Cacau ou Cinema Velho) e o novo Albatroz. Não esquecendo da boemia casamarelense, da feira (a maior do Recife, ia do mercado público até o Cine Albatroz), das peladas nos campos já citados. Nas quartas, era o treino do time de Gama, o Vera Cruz Futebol Clube; nas quintas, era o do Ypiranga; e nas sextas, era o do Canto da Vila (eu como lateral direito ou o então back direito, participava de todos como convidado especial, porém não era sócio de nenhum).
Joguei muito com Paulinho (ex-jogador do Náutico, falecido), Lenildo (falecido), Reo (ex-jogador juvenil do Sport), Nadinho, Caboclo (falecido), Aluísio Manga Verde, Toinho Buchudo (falecido), Júlio (falecido), Marcelo, Brivaldo e Abrivaldo (irmãos falecidos). Bia, Tonico, Zeca (falecido), Paraíba (ex-jogador do Santa Cruz, hoje encontra-se com a perna amputada devido à bomba do aeroporto), Guaberinha (ex-jogador do Santa e do América, falecido). Foi, para mim, o melhor do mundo, pois jogava em todas as posições, até de goleiro.
Sou testemunha ocular de quando Guabera rebateu a pelota de bicicleta como goleiro. Pois bem, era fantástico assistir a uma partida de futebol naquele tempo! Mas como a minha Casa Amarela era tranqüila! E hoje os trens, os bondes, os cinemas, os campos, os times com seus pavilhões hasteados nas tarde de domingo, as sedes, os jogos de ping-pong, os boêmios, os namoros, enfim, os entretenimentos não existem mais. Somente saudade que resta ainda todos os anos na mais popular festa religiosa do Recife, a do Morro de Nossa Senhora da Conceição. Casa Amarela.
José Calvino
RecifeOlinda