O mágico de Oz

Um dia resolvi seguir a trilha marcada no chão do meu destino e encontrar sentido para minha história que de mágica, não tinha nada. Cheguei a empolgar-me quando percebi que algumas maldades, que antes rodeavam a minha vida, foram justamente esmagadas. Foram esmagadas juntamente com aquela bruxa que, há anos, perseguia os rastros dos sonhos. Rastros esses que os meus sapatinhos vermelhos insistiam em deixar pelo caminho...

Naquele dia eu estava realmente desconcentrada. Tentava em vão chegar ao céu através das pistas descobertas, ao acaso, no percurso indefinido da minha história. De repente fui abordada por um cabeça de palha qualquer. Surgiu do nada! Aquele espantalho, apesar de não me conhecer intimamente, tinha muito da minha essência. Ele, assim como eu, fingia não entender as coisas que estavam bem na frente do seu nariz evitando, com isso, sofrimentos desnecessários. Porém algo crucial o diferenciava de mim. O espantalho não admitia conviver com essa fraqueza e lutava bravamente para reverter essa situação. Já eu, dizia sempre: “Esqueça isso, cabeça de vento”. – tentando com essas palavras, convencê-lo que refletir demais, às vezes, faz mal para saúde. Porém, o abobalhado não acreditava muito nas minhas pretensiosas teorias. Vivia torcendo o nariz para as minhas, já consolidadas, fugas convencionais. Apesar das contrariedades que separavam nossas idéias nos tornamos grandes amigos. Eu procurava não pensar muito na vida e ele fazia o mesmo, por falta de opção...

Depois de algum tempo trocando idéias sem nexo e rindo de fatos desconexos, nos deparamos com um leão perdido no meio da “nossa estrada”. De súbito, o tamanho daquele monstro assustou-nos profundamente. Mas seus olhos... ahhh, os seus olhos!!! Eles não enganavam ninguém! Demonstravam medo, insegurança e uma aparente inquietude. Foi minha a idéia de nos aproximarmos, cautelosamente, já que eu também reconhecia a essência daquele olhar. Convivia diariamente com ele quando, de relance, fitava minha própria imagem no espelho. Devagar, a fera indomável cedeu lugar a um filhotinho desamparado. Abracei-o com cuidado. Tão frágil parecia sua alma! Seus rugidos transformaram-se em miados fracos e desprotegidos. Conversamos por horas na soleira daquele atalho. O espantalho não entendeu muita coisa, porém, foi solidário ao escutar suas lamúrias. Encorajei-o a levantar e firmar os passos. A cada obstáculo, lembrava-o que era apenas um novo recomeço, uma nova oportunidade. E assim, passo a passo, seguimos juntos por um longo caminho. Eis que, no meio de uma encruzilhada surgiu um homem. Um homem comum, igual a tantos outros por aí: enferrujado e sem coração. Nos aproximamos um tanto receosos pois, onde não se tem um coração não existe sentimento e muito menos vida. Mais uma vez estávamos enganados! Como as aparências enganam! Como fomos fúteis ao julgarmos uma vida por um momento, um coração por uma palavra, ou pior, uma história por uma cena! Essa “ferrugem” interior havia comprometido todas as nossas ações, antes solidárias. A arrogância havia corroído nossas boas intenções. A superficial arrogância dos nossos conceitos, não havia lubrificado de forma satisfatória a engrenagem aniquilada do nosso coração. E uma engrenagem em desequilíbrio, não produz ações de qualidade...

Olhamos novamente para aquela “aparente” impossibilidade humana, como se fossemos capazes de medir, entender ou julgar o amor. Aquele homem de lata não somente lutava para combater a visível dificuldade dos seus movimentos, como também se esforçava para plasmar um pouco de sensibilidade aos julgamentos que lancetavam, sem piedade o seu, até então, imperceptível coração. Frente a qualquer emoção, ao contrário do imenso leão que desmanchava-se em lágrimas, o homem de lata era incapaz de chorar. Apesar de sentir a dor latejante em seu coração de aço inoxidável, ele não conseguia transmutar sua dor nas nossas, tão esperadas, lágrimas! Ele era diferente de nós, sim! Mas nem por isso menos sensível! Percebemos, depois de algum tempo, que todos nós somos diferentes na forma de ouvir, de falar, de sentir e de reagir frente às situações. E por isso, um não tinha o direito de julgar o outro, nem pelas lágrimas, nem pelo riso, nem pela extravagância, tampouco pelas suas poucas palavras. Isso porquê não tínhamos a mesma história, nem o mesmo enredo. Após essa descoberta, formamos um trio: uma menina que recusava-se a “crescer” por opção, um espantalho que não falava nada com nada por falta de opção, um leão medroso, inseguro e chorão, e um homem extremamente sensível, mesmo sem ter dentro do peito um desejado e aceitável coração. Encontramos, em nós mesmos, o equilíbrio. Nos completamos com as nossas diferentes habilidades e nos deixamos ajudar com as nossas também diferentes fragilidades. Aprendemos a entender as nossas limitações e a lutar juntos para superá-las. Nos abraçávamos quando o frio da insegurança batia na janela dos nossos medos e nos isolávamos quando o silêncio era o único capaz de refazer nossos diagnósticos imediatistas. Li em algum lugar um poema que dizia que “nós humanos, somos anjos de uma asa só, e que para voar, precisamos nos abraçar...”

E eu, que até então, tentava burlar o caminho preto e branco da minha história com suspeitos atalhos cor-de-rosa, encontrei sem querer, na essência dessa amizade o verdadeiro colorido da vida...

E se você olhar bem fixamente para o céu, num desses dias onde a brisa corre liberta entre a flexibilidade das nuvens e um arco-íris contrasta imaturo frente a imponência do Mestre Sol, tenho a certeza que você será capaz de enxergar nosso “bando”, voando alto na companhia de Peter Pan. Afinal, estamos na Era da Globalização...