Cansei de ser mulher...

Cansei de ser mulher...

Passei da época de aprovação, quero mais é ser polêmica!

Passei da época de camuflar minhas verdades, quero mais é conviver com minha espontaneidade.

Passei da época de conquistar o que eu amo, quero mais é seduzir o que desejo.

Passei da época de ser aceita, quero mais é pagar pra ver.

Ficar na defensiva? Chega.

Quero mais é partir para o ataque.

Passei da época de esconder as cartas, quero mais é blefar no jogo.

Passei da época de ceder lugar às minhas velhas lembranças, quero mais é furar a fila da minha ousadia.

Passei da época de esperar meu dote, quero mais é apostar alto nas coisas que me fazem feliz.

Passei da época de carregar o mundo nas costas, quero mais é pegar carona na leveza das minhas paixões.

Passei da época de plantar sementes, quero mais é colher os frutos das minhas preferências.

Passei da época de chorar pelos cantos, quero mais é protestar as dores do meu peito.

Passei da época de esconder meus anseios, quero mais é deixar clara as verdades do meu coração.

Passei da época de aquietar e oferecer a outra face, quero mais é quebrar a cara por algo que valha a pena.

Passei da época de dançar seu bolero com meu salto, quero mais é dançar descalça o meu tango no seu teto.

Passei da época de esperar a razão me pedir em casamento, quero mais é fugir com a loucura, sobrevoando de cavalo alado o céu do meu firmamento.

Passei da época de assoviar, tímida, uma melodia.

Quero mais é escancarar, liberta, toda minha devassa alegria.

Passei da época de esperar meu tempo, quero mais é acelerar as horas.

Passei da época de poupar minha vida, quero mais é morrer de amor.

Passei da época de fechar meus olhos para as migalhas do meu passado, quero mais é usar e abusar das lentes de aumento que descobri no baú das minhas esperanças.

Passei da época de diminuir o tom das minhas palavras, quero mais é estourar o som dos meus exageros.

Passei da época de sussurrar de amor.

Quero mais é gritar de prazer.

Passei da época de esconder as minhas vontades.

Quero mais é escancarar a minha inconseqüente liberdade.

Passei da época de esperar elogios, quero mais é causar impacto.

Passei da época de me constranger com críticas, quero mais é reprovar nos critérios estabelecidos pelos Mestres da Infelicidade nessa vida.

Passei da época de sorrir, quero mais é gargalhar.

Passei da época de sofrer no acostamento dos meus medos, quero mais é correr riscos, mas em alta velocidade.

Passei da época de remar contra a maré, de entrar em barco furado, de andar com o freio de mão puxado!

Quero mais é nadar a favor das minhas vontades, sem seguro obrigatório e ainda com o piloto-automático ligado!

Passei da época de assumir culpas alheias.

Quero mais é garantir a absolvição dos meus seqüestros.

Passei da época de grudar meus pés no chão.

Quero mais é flutuar no balanço maroto dos meus devaneios.

Passei da época de ser mulher.

Quero agora é fazer o caminho inverso.

Quero pular amarelinha e chegar no céu, antes que meus pés desequilibrem no meio do jogo.

Quero brincar de Stop com meus problemas e somar os pontos dos meus investimentos.

Quero jogar minhas preocupações para o alto, fazendo-as na mesma altura das petecas coloridas que alegram o meu cotidiano.

Quero escorregar entre minhas verdades, fazendo-as girar contra as hipocrisias dessa vida.

Quero brincar de esconde-esconde com meus medos, deixando-me levar pela adrenalina inconstante dos meus sonhos.

Quero brincar de casinha, mas não quero ser a mamãe.

Quero brincar de boneca e me permitir ficar quietinha num canto sem ser cobrada pelo meu necessário silêncio.

Quero dormir por horas sem culpa, quero que peguem na minha mão quando a movimentação de uma rua ameaçar a minha segurança.

Quero voltar a ser menina.

Quero me encantar com as coisas simples do meu cotidiano.

Quero chupar um sorvete sem pressa, sem me importar se ele está derretendo bem mais rápido do que a minha vontade em saboreá-lo pausadamente.

Quero, sem preocupações, ter o direito de me sujar.

Quero colocar a cabeça para fora do carro, deixando meu cabelo se despentear.

Quero arriscar meus próprios passos, experimentando a sensação de calçar alguns sapatos, às vezes bem maiores do que o tamanho dos meus pés...

Quero voltar a ser menina inconsequente.

Cansei de ser mulher independente.

Quero pedir colo e chorar quando o medo do escuro ameaçar minha frágil segurança.

Quero fazer manha e ganhar mil beijos quando fizer toda lição de casa.

Quero a liberdade de falar o que penso, sem ter a obrigação de agradar as pessoas com as minhas vãs e infantis filosofias.

Cansei de ser mulher educada.

Quero ser menina mimada.

Cansei de ser mulher. Cansei de ser responsável.

Cansei de ser, politicamente, correta.

Acho que, definitivamente, passei dessa época!

Quero ser menina.

Quero retroceder no tempo.

Quero ser cuidada...

Quero viver, o resto da minha vida, como uma adorável e enigmática criança mimada!