Cafajeste
 
            Alguns tipos gostam de interpretar o cafajeste. Outros são mesmo.
            Maurinho era a figura tal e qual. Musculado, tatuado, sempre com jeans visivelmente passado na água sanitária para descolorir e seus tênis espalhafatosos. Seu trabalho nunca foi conhecido. Diziam ser filho de homem rico, que havia expulsado o cretino de casa.
            Trabalhou no começo numa loja de ferragens, mas logo foi despedido. Foi parar em outra do mesmo ramo, conhecia o assunto bem por ter na família um próspero comerciante onde se vende do prego até o sofisticado chuveiro que se regula a temperatura desejada.
            Num belo dia, apareceu uma mulher querendo uma torneira especial para o tanque. Ele trouxe uma, de alavanca, e afirmou ser a melhor. A moça, bonita, por sinal, perguntou se ele sabia de alguém que fizesse a instalação. No ato, o moleque prontificou-se. Ela havia dito que morava perto.
            - Mas eu preciso para hoje, mais tardar amanhã.
            - Não há problemas. Instalo na hora do almoço. É rápido.
            - Pode me dizer quanto cobra?
            - Para a senhora nada. Não vivo disto.
            Na hora marcada, o cafajeste apareceu. Colocou a torneira sob os olhares safados da mulher, que uma vez mais quis recompensar. Era rica. Trouxe um copo de uísque, gelo e uma garrafa dos de excelente qualidade. Era da mesma laia dele, identificaram-se depressa. Beberam juntos.
            Estão vivendo juntos até hoje.
            O cafajeste com seu pequeno, mas rendoso comércio de ferragens, onde o pai investiu sem duvidar, depois que na maternidade, passou a mão na cabeça do netinho, enviado para acabar com a discórdia.
            A vida tem suas surpresas, a cada momento.


imagem:  Maternidade/Pablo Picasso