ESTRAGOS DOS VENTOS DE AGOSTO

No começo foi simplesmente um assovio, como um mensageiro, chegou anunciando e se distanciou. Depois senti um arrepio, aconcheguei-me, esperei que logo fosse passar. Jurava que era uma brisa, mesmo inofensiva, nunca esperei que chegasse a me acariciar. O vento soprando, levemente, insistia em me importunar, ficava aguardando, torcia, investia, especulava um meio de me corromper. Oscilei tantas vezes que perdi a conta do quanto me policiei, a favor ou contra, sempre provocada pelo sopro constante do vento.

Meu autocontrole foi escapando sorrateiramente das minhas mãos, vivendo profunda emoção, meu caminho por despretensão fortalecia a ventania. Que com alvo definido e sem piedade tomou intensa velocidade que passou deixando suspensas as minhas hesitações. Desnuda, me tornei mais vulnerável e nesta hora, rajadas de vento de rara intensidade me destelharam com violenta propriedade. Expostas minhas fraquezas, minhas amarras foram derrubadas, minhas virtudes foram saqueadas e minha energia foi cortada. Com escassa visibilidade tentava em vão não ceder ao desabamento iminente. Antigas e sólidas convicções lutavam bravamente para fortalecer as tentativas de manter-me erguida. Indefesa e entregue aos braços do furacão fui arremessada com indescritíveis forças que inevitavelmente desabrigaram-me.

E quando agosto finda, a calmaria vem ser minha companheira a velar-me melancólica, enquanto contabilizo os estragos, recolho os destroços, supero lembranças e recupero estimas. A reconstrução é lenta, jamais serei a mesma, ninguém passa por terrível tempestade e sai ilesa. As cicatrizes são agora minhas fieis escudeiras, experientes, não me deixam esquecer ou sucumbir à tentação, mas quando ouço um assovio, me arrepio, e a espreita da carícia da brisa, sinto que está me aliciando o vento.

Lilia Costa
Enviado por Lilia Costa em 03/07/2011
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