Badulaque
... Se quiser saber eu gosto da palavra badulaque. O freguês entrou na loja e pediu um badulaque. Disse que a namorada completaria no dia dez de agosto quarenta e dois anos integrais. Nome: Marô. Era um sujeito de feições porcinas com sotaque estrangeiro e dizia “bazulaque”. Quem deseja dar “bazulaque” para uma desgraçada namorada? Enguli minha curiosidade tentando dispensar a mais perfeita ocultação. Estava vestido com a reserva profissional de atendente. Concluí o quanto eram palavras distintas para preservar meu pobre bê-a-bá. Um pouco depois chegaria outro cliente colorido e com os pés de areia do mar. Atenderia com a vassoura próxima. Vassoura nítida no meu esforço de serviçal. Límpida e guardada no subconsciente visível de modo bem prático. Já este senhor de seus oitenta anos vem tomar sorvete e aproveita para me abraçar exclamando: meu velho “a-me-ni-na-do!” Faz questão de abandonar em minhas mãos um saco com ameixas de quintal. Havia perdido um filho num desastre aéreo. Olhava para os meus trinta e dois anos de idade como o mesmo pai silenciado.
Por sorte tem uma hora em que a banda marcial passa com as crianças festejando a doce musicalidade confeitada cadenciadamente. Enquanto ela passa Cláudia compra cinto, frigideira, pinguim de geladeira e pastéis variados. Com alma barulhenta outra pessoa bebe meio litro de cachaça branquinha. Trescala a água velva e canta passando da rascada harmonia ao ganido gutural. As gêmeas sentam com ele para rir tomando laranjada. Olham para ele, depois se entreolham, logo se mijam de tanto rir. Eu acompanho risadas para não perder alegria.
Para trabalhar aqui é preciso respeitar o cliente. Animar a expansibilidade alheia. Caminhar com o cheiro de fritura na alma e a mão na garrafa gelada da cerveja. São diversos mundos repletos de badulaques.
Um passo e estamos lá fora em pleno verão entre corpos torrefados pelo sol. Na esquina entre os Correios e o Posto Cinco surgia Zefa. Zefinha com seu olhar de barlavento mimava meu coração com promessas de carinho para um dia desses. Era uma baixela de prata cheia de afeição e frutas. Meu coração pifado de esperança era servido como um prato de ilusão permanente só que vazio ao morto esfaimado. Finado de paixão sem recusa nem certeza. Bastava que ela me olhasse para surtir o sol de todos os sorrisos aos borbotões. Única mágica para meu rosto. Nascia em segredo o atendente renovado, estufado de vida. Prenhe de sol. Até o pinguço com seu regozijo angolano pesava menos em meu respeito na forma de cinismo prático. Típico de atendente entre badulaques.