Ser mãe é padecer no paraíso

Sempre me considerei uma mãe legal. Me achava bem liberal, às vezes até exageradamente. Como tenho dois filhos, sempre incentivei o Lucas a ter muitas namoradas, sair para baladas todos os dias da semana, não ser muito neurótico com os estudos e até deixar um pouco de lado o seu extremo senso de responsabilidade.

Pois bem, o fato é que tudo isso mudou quando ele começou a seguir meus conselhos. Passei a odiar as namoradas que me eram apresentadas, a “cortar” a mesada para impedi-lo de frequentar as baladas dos finais de semana e até cobrar maior rigor nos estudos, controlando suas notas na faculdade. Quando me dei conta, estava uma mãe chata, implicante e extremamente ciumenta.

Acrescentei, na minha agenda, mais duas sessões de terapia, como providência emergencial. Nada de melhoras. Quando uma das namoradas começou a me chamar de sogra, então! Quase enfartei! Aumentei a dose do antidepressivo. Nada de melhoras. Arrumei um cachorro para me distrair. O que arrumei foi mais dor de cabeça. Pensei em colocar meu filho no internato, mas lembrei que ele já era maior de idade. Estava num labirinto. Passava as noites em claro, esperando o farol do carro iluminar a garagem; lavava camisetas e mais camisetas com manchas de batons esparramadas na gola; analisava pedidos e mais pedidos de aumento de mesada para substituir as cuecas antigas pela coleção de box coloridas; guardava as inúmeras caixas de preservativos espalhados pelos bolsos das calças e pelo estofamento do carro, etc. É uma sensação horrível. De perda. De impotência. De insegurança. De vontade de trancar nossa “cria” no quarto. Vontade de colocá-lo para dormir, de fazê-lo tomar todo o leite quente da caneca, de agasalhá-lo antes de deixá-lo sair no sereno, de congelá-lo até que eu encontre a pessoa ideal para sua vida, de programá-lo para ser feliz; deletando todas as lágrimas e todo sofrimento que mais dia, menos dia, sabemos que irão aparecer. É uma sensação de estar sendo jogada para escanteio. O dia em que ele fez sinal para eu ocupar o banco traseiro para ceder o da frente aquela vigaristinha... nossa, foi uma humilhação a céu aberto. Trocar a própria mãe por uma fulaninha que mal conhecia, ninguém merece! É, parece divertido, mas chega ser uma infindável penitência. Toda mãe espera que o filho fique ao seu lado a qualquer custo. Toda mãe acalenta o dom de proteger o seu menino pela eternidade. De rastrear todos os seus caminhos, de cobrir (com espuma) os espinhos sorrateiros que possam aparecer pela estrada. Porém, sabemos o quanto esses desejos são impossíveis. A maturidade chega de repente, sem anúncios formais. Daí, tudo aquilo que achávamos “tirar de letra”, torna-se um peso quase impossível de suportar. É como se entregássemos nosso menino para vida, sem saber o destino que ela reserva para seu futuro. Então, diante dessa impotência, resta-nos apenas beijá-lo carinhosamente. Resta-nos apenas segurá-lo um pouco mais nos sorrateiros abraços. Resta-nos apenas pedir a Deus que guarde e proteja o mais valioso dos nossos pertences.

Nessas horas, divago. Penso em como somos vulneráveis diante da vida, em como andamos sobre o mar diante da fé, em como somos privilegiadas por exercer difícil arte materna nesse mundo. Nessas horas tenho apenas uma única certeza. A certeza que o amor de uma mãe é o sentimento mais singelo, puro e despretensioso que existe. Sinônimo de renúncia. Um amor que não espera retorno, que não cobra gratidão, que não enxerga dificuldades. Um amor que quanto mais se doa, mais transborda! Um amor sem medidas, sem exageros, sem comparações, sem limites!