Mulheres reais e ideais

Tenho uma amiga neurótica por produtos de beleza.

Gasta horrores! De manhã, depois da compressa de água gelada, começa o ritual dos cremes, com duração média de duas horas. Enquanto espera a atuação dos agentes rejuvenescedores na pele, cuida, morosamente, do cabelo. Unhas impecáveis, toda semana!

Massagens relaxantes e drenagens linfáticas periódicas. Regime perpétuo, sem folgas no final de semana! Não fuma, não bebe e não excede nas relações sexuais! Nunca vi sua boca sem cor. Nunca vi seus olhos sem delineador. Nunca vi, em suas pernas, um solitário pelinho. A depilação é quinzenal! Faça chuva ou faça sol! Suas roupas são finíssimas. Nos pés, só salto quinze.

Ufa! Que tédio ser perfeita! Que insensatez apostar corrida com o tempo! Que bobagem massagear o ego e chantagear as rugas!

Eu sou mais feliz dormindo duas horas a mais pela manhã.

Eu sou mais feliz gastando meu dinheiro com sorvete de caramelo e pizza de chocolate. Eu sou mais feliz com minhas macarronadas semanais, com meus chopinhos nos finais de semana e com meus namoros, na hora que der na teia!

Minha boca, por nunca ter cor... quando tem, todo mundo repara!

Nos olhos, nunca uso delineador, assim não preciso me preocupar em borrar a maquiagem, quando decido chorar de rir.

Não sofro com depilações, uso gilete mesmo! Dor por opção? De jeito nenhum! Minhas roupas, antes de mais nada, são confortáveis! Com elas posso deitar e rolar, a qualquer hora do dia ou da noite. Nos pés, no máximo um saltinho baixo, porém, o que eu gosto mesmo é de uma deliciosa havaianas!

Eu sou mais feliz mostrando a língua para o tempo e contando as rugas dos meus exageros.

Sou feliz assim, longe da perfeição, longe dos padrões aceitáveis! Estou feliz assim. Exatamente como sou. Sem máscaras, sem ceras, sem saltos. Estou feliz assim. Com minhas estrias e meus estresses.

Minha amiga é feliz daquele jeito: acordando com água gelada na cara, passando fome todos os dias, se atracando com as rugas, fazendo barganhas com o tempo.

Cada uma com suas prioridades e necessidades.

Vejo em Rebeca a mulher ideal. Enxergo em mim a mulher real.

Minha realidade não aspira o idealismo de Rebeca.

O idealismo de Rebecca não aceita o realismo do meu tempo.

No seu aniversário, de sacanagem, dou-lhe chocolates finíssimos.

Ela resiste, sem dó!

No meu aniversário, de vingança, ela me presenteia com cremes caríssimos. Eu revendo, sem culpa!