Existo, logo sou diferente

Vou falar hoje sobre um assunto que anda dando o que falar nos cinemas: X-Men. Essa é uma das mais bem-sucedidas franquias dos quadrinhos e dos cinemas, desde que o primeiro filme foi lançado em 2000.

Deixando um pouco de lado a questão do objetivo mercadológico da série (criar mais um universo de super-heróis para a Marvel era a ordem dada á seus criadores, Stan Lee e Jack Kirby, em 1962), acho muito interessante sua mensagem.

Os X-Men são uma equipe de mutantes que lutam contra outros mutantes que usam seus poderes para fins criminosos. Os mutantes seriam fruto de um novo passo da evolução, mas por serem algo diferente são encarados como um câncer a ser destruído por muitas pessoas. "A Humanidade tem medo do que é novo": é uma frase que foi dita muitas vezes pelo vilão honorário da série, Magneto.

A mensagem central de X-Men é a diferença. Como lidar com a diferença? Todos os seres humanos são diferentes, mas eles não encontram aceitação pelos seus pares porque se valoriza um estereótipo que é tido como "o normal". O que pessoas diferentes procuram é aceitação: seja vinda delas mesmas, seja vinda do resto das pessoas.

Existem duas visões, contudo, distintas sobre a aceitação na série: a do líder do grupo X-Men, Professor Charles Xavier, e a do chefe de uma irmandade de mutantes, Magneto. Enquanto Xavier propõe um diálogo com o resto da Humanidade para se chegar a uma convivência pacífica, Magneto defende a imposição dessa aceitação pela violência. Talvez por isso um crítico de literatura norte-americano tenha enxergado nos dois reflexos respectivamente de Martin Luther King Jr. e Malcolm X. Ambos lutavam pelos direitos civis dos negros nos EUA, mas um pregava a manifestação pacífica e outra uma luta mais radical.

No último filme da franquia, lançado recentemente nos cinemas, isso fica muito mais claro em uma partida de xadrez entre Xavier e o futuro Magneto, onde cada um expõe seu ponto de vista. Enquanto um prefere apostar no otimismo, outro se agarra ao pessimismo. Xavier é sempre visto como um sonhador, enquanto Magneto é visto como mais realista.

Aí entramos em uma outra questão: o dilema entre a utopia e a realidade. Mas pretendo me ater no primeiro dilema, o da diferença. Levando para o nosso cotidiano, como pensamos a diferença? Geralmente como algo ruim.

Por exemplo, na própria passagem do tempo e no rumo dos acontecimentos isso é perceptível. As mudanças são encaradas com certa apreensão, o que é normal, mas ultimamente vem sempre acompanhadas de um "quê" de pessimismo. Daí resulta uma espécie de saudosismo pelo passado.

E com as pessoas ao nosso redor. É normal nos espantarmos diante do novo. As pessoas tendem reagir de formas distintas, contudo: algumas admiram, outras recusam. Aquela pessoa que enxergamos como diferente logo é taxada de "estranha", "bizarra", "esquisita". Como se nós fôssemos muito normais! Como diria um velho ditado: de perto ninguém é normal. E não é mesmo! O que tomamos como normal é uma criação e varia de acordo com a nossa cultura.

A recusa do diferente, quando imediata, não procura nem entender o por que desse sentimento, apenas se aferra á uma primeira impressão. Uma coisa é reconhecer que tal pessoa e tal cultura não se identifica com você e outra é desqualificar alguém ou alguma cultura. Na primeira alternativa há o respeito, na segunda, contudo, há apenas teimosia e irracionalidade.

Do que estamos falando aqui? É um assunto bobo? Acredito que não. Vivemos num tempo onde está se valorizando o que foi desvalorizado anteriormente, não só pela civilização ocidental como também pela sociedade brasileira. É um assunto corrente, portanto, bem atual. Na realidade essa preocupação não nasceu hoje (embora tenha ganhado mais visibilidade agora), mas há séculos atrás. Essa é a velha temática do Outro. Na filosofia (e posteriormente na Psicologia) existe o Eu, um ser, e o Outro, um ser diferente. Os dois se complementam, porque um ser precisa de outro para definir sua identidade e suas relações. Essa preocupação foi abordada pela Ética, pela Literatura, pela História e pela Psicanálise. Mesmo assim ainda há muito que dizer.

No nosso caso, aprendemos com esse texto apenas um pouco da ponta do iceberg. Essa foi uma pequena e simples introdução ao assunto. Exatamente por isso não pretendo me deter mais tempo sobre ele agora (deixarei isso para outras oportunidades) e não me preocupo em esgotar o assunto (o que é impossível). E uma introdução que começou com uma discussão sobre uma história em quadrinhos. Modo diferente de começar uma discussão, não?