Quando os pais voltam a ser filhos...

Filhos são flores. Perfumarão, com certeza, a nossa vida.

Filhos são espinhos. Machucarão, tantas outras, o nosso coração.

Nossos filhos viverão além das nossas expectativas, sofrerão além dos nossos cuidados e ficarão em nossos braços muito aquém do que desejamos. Filhos são insubstituíveis; o amor de um, jamais será o bastante para suprir a ausência do outro.

Filhos são prioridades; as suas necessidades gritam ao nosso coração e os seus pedidos seduzem qualquer impossibilidade.

Filhos são as causas de todas as nossas lágrimas, sejam elas de alegria ou de tristeza; de orgulho ou decepção; de amor ou de saudade; de carinho ou de desprezo.

Filhos são cristais, apesar de aparentarem aço. Escondem a sua beleza, expondo uma auto-suficiência quase clandestina. Guardam as palavras esperando um momento certo para dizê-las, esquecendo que o tempo nem sempre é compassível às suas vontades.

Esses dias estive pensando em quanto essa vida é injusta. Num dia temos um filho nos braços e no outro ela arranca-o dos nossos cuidados sem nenhum consentimento.

Num dia trocamos as suas fraldas e no outro somos trocados por eles, não com tanta alegria, nem com tanta dedicação da qual dispensamos.

Num dia enxugamos as suas lágrimas e no outro eles são os principais motivos das nossas...

Num dia defendemos as suas idéias e no outro, somos acusados por elas...

Num dia colocamos nossos filhos para dormir, ajeitamos suas cobertas, apagamos a luz e aguardamos, ansiosos, o futuro amanhecer.

Num dia acordamos pela manhã e percebemos que a cama está pequena demais para o tamanho dos nossos bebês.

Num dia levantamos no meio da noite e encontramos o quarto vazio, tudo em seu devido lugar, limpo demais, silencioso demais! Percebemos, então, que os nossos filhos se foram. E choramos por vê-los libertos dos nossos cuidados. O futuro chegou cedo demais para nós. Nessa hora, as necessidades se invertem. Nós é que passamos a necessitar de carinho, de alguém para enxugar as nossas lágrimas, de alguém para ajeitar a coberta em nossos ombros ou as meias em nossos pés.

Nessa hora, voltamos a ter medo do escuro e quase imploramos por um colo! Nessa hora queremos nossos filhos de volta para nos contar uma história, rezar conosco um pai nosso e apagar a luz, depois de um demorado beijo de boa noite .

Nessa hora, queremos palavras e não simplesmente intenções.

Nessa hora queremos presenças e não visitas.

Nessa hora queremos abraços e não cumprimentos.

Nessa hora queremos, enfim, voltar a ser filhos! Queremos ser cuidados! Queremos que nossos meninos sejam, por algum tempo, nossos pais. Queremos a proteção de um ventre para acolher nossas inseguranças. Infelizmente, poucos filhos percebem que os seus pais não são de aço, mas sim de flores, como o sugestivo título do livro de Fábio de Melo. Infelizmente, a maioria dos filhos, percebem, tarde demais, que as flores não são eternas, que mais cedo do que esperamos elas murcharão, deixando apenas a lembrança dos seus perfumes e a beleza delicada das suas pétalas...