Artistas anônimos

Fico pensando como os valores em nossa sociedade estão perdidos. Tanta gente boa, com talentos extraordinários, desempregada, vivendo de “bico”, submetendo-se a ganhar um milésimo do que realmente merecem. Artistas consagrados no talento, anônimos no reconhecimento.

Conheço músicos que tiram o fôlego com a expressividade da sua voz. Conheço pintores que com as suas obras extraem lágrimas dos peitos mais áridos. Conheço escritores magníficos que não são lidos. Conheço artesãos fora do comum, esquecidos nos bancos das praças. Artistas que imploram olhares, que esperam oportunidades!

No início desse ano um argentino realizou uma demonstração da sua técnica de pintura na porta da escola onde eu trabalho. Uma coisa impressionante! Quase mediúnica. As formas ganhavam vida a cada toque. Fiquei fascinada! Embevecida com o talento daquele moço. Vendia, na época, cada tela por quinze Reais. Valia, na minha opinião, cem vezes esse valor. De repente, ouvi de um espectador a coisa mais insensível de todos os tempos: “Isso não vale mais do que cinco Reais.Você não demorou nem dez minutos para pintar!”

Fiquei com vontade de pintar a arrogância daquele senhor com a sensibilidade daquele artista. Seria uma obra perfeita!

Domingo passado fui almoçar num restaurante simpático nos altos da cidade. Enquanto esperávamos o garçom fiquei extasiada com a voz, a afinação e o sentimento com que o músico “paria” sua arte, num canto isolado do estabelecimento. A forma com que aquele músico “dava luz” ao seu talento arrancou-me lágrimas! Não foi o dueto, voz e violão, que me impressionou. Foi à tríade: voz, alma e coração que encantou os meus sentidos! Eu quase não conseguia olhar para a comida. Aquela música alimentava a minha alma. Olhei em volta. Todos comiam sem darem a menor atenção ao som que iluminava aquele ambiente. Fiquei pensando na insensibilidade daquelas pessoas que sequer levantavam os olhos de dentro da cumbuca de feijão. Senti uma angústia lancinante transpassar meu peito. Será que teremos artistas daqui a alguns anos?

Na saída, ao passar pelo músico, reverenciei o seu dom em silêncio. Rafael é o seu nome. Nome e voz de Anjo. Pena ainda não ter espaço para voar, porque asas, com certeza, já possui...

Infelizmente, a sensibilidade não tem muito valor nos dias de hoje e isso é uma tristeza indescritível! Não consigo imaginar um canto sem um encanto! Não consigo imaginar um silêncio sem uma trilha sonora! Não imagino um mundo sem cores, sem formas, sem músicas, sem histórias...

Gilmara Giavarina