QUEM SOU EU?

Acho tão estranha essa pergunta: “Quem é você?”. Já perceberam como ela está presente em quase todos os lugares que nos embrenhamos? Dia desses fui preencher um questionário na NET, e lá estava a tal perguntinha: “Responda, em no máximo seis linhas, quem é você.” Como isso é possível? Nenhum ser humano do mundo tem esse poder de redução. Eu, por exemplo, sou tantas coisas nessa vida, como posso “me espremer” em seis míseras linhas? Bom... depois de uns dias, como parte de um processo seletivo, lá estava eu, esperando na sala do escritório, a avalanche de perguntas na segunda etapa do processo. De repente, entra a secretária com uma lista nas mãos e chama meu nome em voz alta. Entro, meio sem jeito, e deparo-me com uma baita sala de reuniões. Elegante e séria, a psicóloga do R.H. me aguarda silenciosa. Mal me acostumo com o ambiente e adivinha qual a primeira pergunta que aquela bendita senhora me faz. Isso mesmo. Analisando-me de cima embaixo, pergunta com um ar terrivelmente arrogante: “Quem é Gilmara?” Juro que me senti uma cagueta, deletando a mim mesma para uma senhora que eu nunca vi na vida. Como assim, quem sou eu ? Que falta de criatividade absurda é essa? Dá vontade de responder: Não sei não, nunca ouvi falar nessa pessoa. Enfim, parafraseei umas colocações um tanto ensaiadas e saí daquele lugar intrigada. Nem eu mesma conseguia me definir. Voltei para casa meio desanimada e então, para relaxar, resolvi criar uma página no orkut... e qual a primeira pergunta que eu tenho que responder??? Adivinhou quem pensou: “Quem sou eu ?”

Sabe que, pensando bem, essa é uma das respostas mais difíceis que eu já respondi em toda a minha vida. Difícil porque, muitas vezes, nem eu mesma consigo me entender. Acho que posso ser definida como uma “mulher simplesmente complicada”. E confesso: não estou nem um pouco preocupada em descomplicar essa minha imagem. Gosto de ser polêmica, “amada ou odiada”... mas única! Sempre fui livre. Nasci livre, cresci livre e morrerei livre. A última vez que tentaram prender os meus pés no presente e algemar minhas mãos na terra, entreguei minhas horas ao silêncio e me permiti definhar lentamente de tristeza. Minha alma é livre, meu coração é livre. O cárcere não me limita, me mata. A liberdade é o meu oxigênio. Sou livre em meus pensamentos, em meus anseios, em minhas saudades, em minhas vontades, em minhas loucuras. Sou vida, sou simplicidade, sou alegria! Às vezes meus invernos internos chegam em pleno verão externo. E neles, me permito enclausurar. Embaixo dos cobertores, que são meus únicos álibis, choro por dias a fio, agonizando minha alma no vácuo nebuloso das minhas incertezas. Nessas horas preciso de carinho, de colo e de silêncio. Preciso de um tempo para vencer a minha própria solidão. Talvez porque sempre fui mais asas que chão, muito mais a segurança do amor, do que o improviso da paixão. Sou um sentimento a flor da pele. Sou aquela menina com flor no cabelo. Sou uma mulher com flores nos olhos. Sou como arte abstrata que precisa ser decifrada, interpretada, estudada, sentida, apreciada... e principalmente aceita.

Confesso que sou uma mulher do tipo nada convencional: não gosto de ganhar flores, não gosto de ganhar jóias, detesto perder tempo no cabeleireiro, corto volta dos shoppings e recuso, incontestavelmente, convites de festas e jantares sofisticados.

Gosto de encontros naturais, amo a sofisticação da simplicidade. Gosto mesmo é de comprar bugigangas nas feirinhas de artesanatos da cidade e de contar piadas, em churrasquinhos, nos finais de semana. Gosto de varar a madrugada tomando vinho com os amigos no sofá ou nos puffs espalhados pela sala, ou de comer uma bela pizza de calabreza assistindo uma comédia romântica na hora que me “der na telha”. Sou uma mulher que é mais fácil se render a um olhar penetrante, do que a um valioso anel de diamante. Gosto de me embriagar com cheiros, com aromas, com sabores, com prazeres. Gosto de ser alimentada pelas mãos sedutoras de um homem, na calmaria da minha varanda, ao invés de ser servida pela gentileza de um garçom, no luxo de um restaurante de grana. Etiquetas, luxos diplomas e afins nunca me impressionaram. Acho gente rica um porre! Gosto mesmo é de andar livre, leve e solta pelos meus domínios, descalça no verão e de meias no inverno. Scarpin e salto agulha são instrumentos de tortura pra mim. Não que eu despreze as delicadezas e as sutilezas mas, sinceramente, prefiro aqueles “trancos” de arrancar suspiros e tremores. Gosto de poesia declamada, mas também de frases desconexas e sussurradas no pé d’ouvido. Gosto de mãos dadas, mas me rendo a outros tipos de pegadas. Gosto de sorrisos repentinos, de piscadas maliciosas, de olhadas mal intencionadas. Gosto de ficar na dúvida para decifrar pequenas e interessantes charadas. Gosto de surpreender, mas muito mais de ser surpreendida. Gosto, às vezes, de ficar na espera... de sentir uma certa instabilidade, para depois sentir-me a mulher mais segura de todos os tempos. Gosto de trocar idéia com gente interessante, aprecio o bom humor mais do que qualquer qualidade e também curto ficar sem fazer nada, absolutamente nada. Gosto de preservar o meu espaço, preciso de tempo para minhas reflexões constantes. Nessas horas gosto da noite, muito mais que do dia. Faço dezenas de poemas e varo a madrugada cantando e chorando com Júlio Iglesias e Joanna. Podem rir. Sou brega mesmo. Eu amo a sensibilidade dos bregas, principalmente quando estou nostálgica e apaixonada. Porém, em outros momentos, torço para que o dia prolongue suas horas. Nesses momentos, sou mais gargalhada do que sorrisos e mais pudim de leite condensado do que cake com caramelo. Nesses dias sou videokê, acompanhada com chocolate e Coca-Cola. Nesses dias sou vinho com sexo. Sou beijo com carinho. Sou abraço com rodopio. Sou poesia com canções de amor. Sou muito mais sonhadora do que realista. Sou alguém que vai morrer acreditando no ser humano, nas amizades e na concretização de todos os meus sonhos. Sabe de uma coisa? Sou apaixonada por muitas coisas nessa vida: por autores maravilhosos, por músicas deliciosas, por pessoas encantadoras, por cinema, por teatro, por culturas diferentes...

Também sou apaixonada pela fé, e pela energia que certas pessoas demonstram em seguir em frente mesmo quando é nítido que o mar está voltando contra seus esperados milagres.

Tenho paixão pelas pessoas que fazem bem para minha vida, pelos ambientes que acolhem meus pés com carinho, pelas palavras que adoçam meu coração sem medida, pela vida que ainda não foi totalmente explorada pelos meus exageros.

Sou feita de cores, de flores, de aromas, de sensações.

Ahhh se eu pudesse realizar materializações isoladas da minha alma!!! Inundaria essa vida com meus sonhos cor-de-rosa. Essa cor que, pra mim, representa a infância, a ingenuidade, a alegria.

Se eu pudesse me transformar numa nota musical, seria o sol.

Se eu pudesse me transformar numa uma flor, seria um beijo branco. Pequeno, delicado e castro... mas que todo mundo conhece! Se eu fosse uma palavra seria representada pela “teimosia”.

E se eu fosse um instrumento musical, com certeza, seria uma harpa. O músico, para me tocar, teria que primeiro fechar os olhos e envolver-me com seus braços, e somente depois, teria a honra de contemplar o som que emanaria do meu coração.

Eu sei que não sou uma pessoa muito fácil de se entender mesmo... quando o assunto é “alma, coração e vida”, nunca me contentei com migalhas. Quero sempre o além, o mais, o extra!

Me considero uma simples mortal brincando de pega-pega com os Deuses. Às vezes Eles me emprestam suas asas e deixam-me sentir parte Deles. Nessas horas sou o mar, sou o pôr-do-sol, sou a maresia, sou o cheiro de chuva! Em alguns instantes, chego a sentir-me deitada, no aconchego do colo do meu Criador... sinto pulsar a imortalidade da minha alma na frágil vidraça do meu corpo. Nessas horas, sinto-me forte. Não tenho medo de nada. Enfrento qualquer tempestade na escuridão. Mas quando percebo espalhar o Seu cheiro pelos ares, sinto que estou novamente só, porém, mais livre ainda, mais liberta, mais menina... aí sou um tanto doce demais, mais infantil que o normal, mais leve que o habitual! Nesses dias sou aquele calorzinho com chuvisco, que quase sempre acaba com um lindo arco-íris nos olhos.

Em dias comuns, não sou compras, nem vitrines. Não sou moda, nem griffe. Sou camping com pescaria. Sou pé no chão. Gosto de sentir o terreno onde estou pisando. Se a barra está quente, corro e pulo fora! Aprendo rápido o que eu quero... e só faço o que me dá prazer! Faço questão que as pessoas que eu amo saibam disso o tempo todo. Penso o mesmo com aquelas que eu não suporto. Infelizmente, uma virtude que eu não tenho é “paciência”. E nem me esforço para adquiri-la. Gosto da minha impulsividade.

Também tenho milhões de defeitos: sou exagerada, dramática, mimada, intransigente, quebro as regras, omito os fatos, falo demais, escuto de menos... mas alguma mulher, exceto Madre Tereza de Calcutá, é diferente???

Sou teimosa ao extremo: como a sobremesa antes do almoço, deixo para amanhã o que eu posso fazer hoje, vou deitar de madrugada mesmo tendo compromisso importante às 7h da manhã seguinte, omito sobre o verdadeiro saldo do meu cartão de crédito, compro dezenas de livros novos, mesmo sem ter lido um terço dos que eu comprei no mês passado, entro offline no MSN para escolher com quem eu quero conversar, deixo de pagar uma conta para passar uma noite no Motel com meu marido, e por aí vai... são pequenas regras que podem e devem ser quebradas, sem que você perca seu lugarzinho no céu por isso.

Muitas vezes sou temperamental: acordo e me recuso a levantar da cama, exijo que as pessoas leiam o meu pensamento e façam as minhas vontades, detesto que me incomodem quando estou escrevendo, e reclamo da sacanagem de me deixarem por muito tempo sozinha quando estou relaxando...

Enfim, é por essas e outras que fico P. da vida quando me perguntam quem sou eu... e ainda restringem minha resposta em seis linhas... ahhh, fala sério: isso, por acaso, é normal?????

Gilmara Giavarina