Hotel ou Motel? (Revisado - Versão 2)
A curiosidade das crianças coloca os adultos muitas vezes em saias justas. Ver um homem ou mulher feitos gaguejarem e se perderem nas palavras para dar uma resposta aos pequeninos é deveras hilariante, como diz o ditado, “pimenta nos olhos dos outros é refresco”. Nem pedir um aumento para o carrasco do seu chefe parece uma tarefa tão árdua.
Não diferente de outras crianças, sempre fui extremamente curioso. No entanto, essa curiosidade parecia estar acima da média, o que sempre me levou a buscar as coisas mais a fundo, tinha uma sede imensa de conhecer o mundo que me rodeava. Enquanto as outras crianças estavam perguntando “O que é isso?”, eu já estava no famigerado “Por que?”. E quando os outros chegavam ao “Por que?” eu estava no “Não seria melhor assim?”.
Minha mãe, que criou os filhos sozinha, pois ficara viúva muito cedo, era professora primária e portanto para mim naquela idade, era um expoente de conhecimento e sabedoria, pois sempre respondia todas as minhas indagações. Não era incomum perguntas impróprias e situações constrangedoras pelo qual eu fazia minha mãe passar, mas ela sempre tinha uma boa resposta na ponta da língua. Mas desta vez, o desafio era digno de honrarias.
Aos quatro ou cinco anos de idade, estava eu com minha mãe indo visitar um parente em outra cidade. Tal trajeto era foi por um ônibus circular que vivia sempre lotado. Ela me pôs sentado no banco do corredor, enquanto permaneceu de pé ao meu lado. Eu gostava de andar pelas ruas, especialmente de ônibus ou carro, pois estava aprendendo a ler e costumava ler todos os outdoors que via pelo caminho, e obviamente bombardeava minha mãe com perguntas sobre o significado daquelas coisas que estava lendo.
Tão logo percebi que estava adiantado em relação as outras crianças, meu ego infantil falou alto. Nesta viagem de ônibus, vi alguns letreiros de luz neon que me chamaram a atenção e resolvi perguntar sobre aquilo para minha sábia mãe, que a tudo sabia. No entanto, fiz questão de perguntar bem alto e em bom tom, para que todos soubessem que o pequenino ali naquele banco de ônibus lotado era esperto o suficiente para fazer perguntas que outras crianças da mesma idade seriam incapazes:
- Mãe! Mãe! Qual a diferença entre motel e hotel? - Perguntei triunfante.
Minha dúvida era sincera, realmente queria saber. Mais sincero ainda era minha intenção em chamar a atenção daquelas pessoas, e parecia ter dado certo, pois todos olharam atônitos para mim, mas segundos depois direcionaram seus olhares para minha mãe. Estavam mais ansiosos do que eu para ouvir a resposta, como se aguardassem o desfecho de filme magnífico! Alguns pareciam estar extremante apreensivos com aqueles segundos de agonia como se estivem aguardando o assassino aparecer a qualquer instante e ceifar a vida da vítima. Outros pareciam estar na expectativa do final de uma piada para poder gargalhar. Talvez esperassem algo do tipo "Fica quieto moleque!" ou "Não é nada, fica quieto aí!". Mas minha mãe não faria isso, não me deixaria sem resposta, pois sabia que eu insistiria. Ela pensou por um instante, respirou fundo, calmamente olhou para mim e respondeu-me com tranquilidade, sob os olhares curiosos dos outros passageiros:
- Em um motel vão apenas casais, e em um hotel vão famílias.
Processei a resposta por alguns segundos em minha cabecinha e me satisfiz com a resposta. Os passageiros que aguardavam o final da piada se frustraram, pois não tinham do que rir. Aqueles que estavam agoniados com a situação que impus a minha mãe se aliviaram e esboçaram um sorriso para ela como se quisessem dizer “Bom trabalho!”, a mocinha havia derrotado do assassino cruel. Voltei a admirar os neons "Motel" e "Hotel", pensando: "Mas que coisa estranha! Um casal não pode ir no hotel? Só depois que tiver filhos? Por que a família não pode ir para o motel? Será que não tem cama? Mas isso resolve com um colchãozinho no chão! Já sei! Já que ninguém teve essa ideia, farei um Motel-Hotel, assim todo mundo pode ir e vou ganhar muito dinheiro. Por que ninguém teve essa ideia antes? Espero que ninguém tenha até eu crescer!". Assim, após alguns anos e já crescido, entendi o que minha mãe quis dizer com casais e famílias, percebi então que meus planos para o ramo "hoteleiro-moteleiro" não vingariam.