POETA, POIS, POESIA OU MANIFESTO POÉTICO AO AMOR DOENTE

Eu gostaria de me desculpar com a sociedade. Peço desculpas por ser poeta e não corresponder aos padrões racionais que geram a violência e a corrupção; peço desculpas porque tenho mais amigos do que puxa-sacos e não posso dar mais afeto a estes do que poderia dar aos primeiros; peço desculpas aos que têm inveja, por não querer que eles morram de repente (que pena!); peço desculpas pelos que morrem de ciúmes, porque a solidão vai confiná-los na apatia; peço desculpas aos arrogantes, que arrotam, sob uma máscara enferrujada da mesquinharia, a angústia e o desespero da solidão; peço desculpas aos estúpidos de pai e mãe, por terem tido pai e mãe (que pena!); peço desculpas aos ignorantes que se tornaram burocratas e aos burocratas que se tornaram ignorantes, porque não serei solidário com eles em reuniões para marcar reuniões, nem em discussão sobre o sexo dos anjos, pois até aonde eu sei, anjos não têm sexo (que pena!); peço desculpas aos que não gostam de poesia, de Homero a Matsuo Bashô, de Camões a Baudelaire, de Castro Alves a Haroldo de Campos, de Augusto dos Anjos aos nossos coetâneos maxi-e-minimalistas, porque os seguidores de uns e de outros continuarão a fazer poesia, recebendo o nome de poetas como expressão de força e, em muitos casos, como força de expressão; e por fim, eu, Carlos Gildemar Pontes, poeta e professor, agradeço de coração e mente às minhas filhas Catarina e Bárbara, por me fazerem pensar duas vezes antes de escrever um poema, pois sem elas talvez eu me aventurasse a fazer poesia como aquelas chatices dos pós-concretos. Mas, felizmente existem Bandeiras e Baudelaires, Cecílias e Pessoas, Patativas e Nerudas, Rilkes e Vinícius, para nos afastar do indelével tédio do cotidiano. Por fim, reconheço edipianamente, minha mãe-superheroína, pela sua origem serrana, que trouxe para o litoral onde nasci o cheiro das florzinhas muçambês e uma coragem de dobrar moinhos onde havia moinhos e dragões.

Carlos Gildemar Pontes

gilpoete@yahoo.fr