Namorado Maquiavélico
        
       Domingo passado, Dia dos Namorados, na fila do cinema, uma bela jovem observou ao seu jovem namorado que ele era maquivélico.  Espantado, indagou-lhe o porquê. A resposta foi confusa, enigmática: “- Você sabe...” Insistiu ele: “- Eu?” Repetiu - lhe ela: “- Sim, maquiavélico!” Sem querer ser indiscreto, também me interessou aquela explicação para perceber até onde se estenderia o conceito de “ser maquiavélico”, tão estudado nas ciências políticas. Com certeza, o próprio Nicolau Maquiavel, autor de “O Príncipe”, estranharia ser referência teórica para discussão de namorados, à porta do cinema. O assunto, quase como filme, ao contrário da fila, saiu do lugar: pelo escutado, a razão de tudo seria falta de sinceridade. Preocupação cabível àquela data, porque o amor é relativo à sinceridade de quem ama.
       
       Ora, Maquiavel se tornou famoso em teorizar, na política, porém sendo mais descrição do que intenção, como chegam os poderosos a um determinado fim sem se considerarem valores éticos dos meios ou dos caminhos que levem a um pretenso objetivo, conforme o inaceitável jargão de que “os fins justificam os meios.” E assim, descreve tortuosos ou diretos passos pelos quais deverá seguir o poder, se quiser lograr êxito nas conquistas e sobrevidas políticas, apoderando-se, cada vez mais, de novos espaços. Assim, a sinceridade atrapalharia. Baseado em fatos, esconde caminhar, sorrateiramente, para o sul, divulgando que está indo para o norte...
       
       Na realidade, esse tipo de maquiavelismo ronda nossa política: desmesurada insinceridade para com o povo. Infelizmente, os poucos “programas de governo” não são escritos para releituras e cobranças posteriores. Tudo é dito como promessas levadas ao vento, nada resta para lembrar a fraca memória do povo. Planos, atitudes, compromissos se tornam puro fingimento. Também o não avaliável; pois, difícil é estimar o que não se quantifica ou não se materializa, sobretudo coisas intangíveis e invisíveis,  como “assegurar maior integração entre o governo e o povo...” Quem conferiria esta demagogia?  E ao povo, como àquela namorada, resta se contentar com mais um filme já visto e revisto nas telas da vida. Compromissos ditos apenas para angariar simpatias, intuindo eles a advertência de Sofocleto: “Todos os antipáticos são sinceros”. Um mal lembra outro. Tanto aquele namorado como conhecidos candidatos se metamorfoseiam, se escolhidos, agem seguindo o não dito.  É maquiavelismo, a moça tinha razão: esses insinceros são “maquiavélicos”...