A AMPULHETA

Um dos diversos instrumentos que o homem concebeu para medir o tempo foi a ampulheta. Também conhecido por relógio de areia. A sua invenção é atribuída a um monge de Chartres, na França, de nome Luitprand, que viveu no século VIII. É formada por dois cones de vidro,ocos,unidos pelo gargalo, de modo a deixar passar a areia de um para outro, através de um orifício. A duração da passagem da areia marca um intervalo de tempo. Para proteger a estrutura, uma armação de madeira. Mais tarde as ampulhetas passaram ser feitas de uma só peça de vidro com um orifício para passagem da areia.

Num aniversário meu, uma amiga deu-me de presente uma pequena ampulheta. Achei uma idéia diferente e o objeto muito interessante. Coloquei-o sobre minha estante de trabalho, numa parte mais elevada. Durante algum tempo ela permaneceu ali e eu apenas a via numa dessas viradas de cabeça, passando por ela o olhar sem fitá-la. Ela estava ali despercebida por mim. Um enfeite. Nada mais.

Certo dia, trabalhava um texto e estava com dificuldade de dar-lhe uma sequência condizente. As palavras seguiam obedecendo minha digitação na rapidez que afloravam de meu pensamento e iam se alinhando no crescer do texto. Quando fazia uma pausa, uma leitura do que já havia grafado me levava à conclusão de que tudo estava sem nexo. Era necessário retomar o andamento em algum parágrafo anterior no qual eu perdera o rumo mais adequado do âmago da situação em descrição. Numa destas paradas, antes de recomeçar, dei de nariz com a ampulheta. Ali, no seu lugar de costume. Na sua inércia parecia desafiar-me. Num primeiro momento, não entendi porque me havia fixado nela. Isto interrompeu meu ritmo de trabalho. Por alguns instantes, fiquei com o olhar centrado nela.

Passado alguns segundos, ou seja lá que tempo, mas muito rápido, tomei-a de seu lugar e coloquei-a no mesmo plano onde eu estava digitando. Inverti sua posição de apoio. A areia começou a fluir da parte de cima para a de baixo. Enquanto isto acontecia, transportei-me ao dia em que fui presenteado. Os grãos de areia desciam velozes. A ação durou cinco minutos. Nesse intervalo revi minha amiga através da ampulheta, pois o objeto do presente a trouxe à minha lembrança. Além de fazer uma pausa no trabalho, revivi na ampulheta a amizade fluindo em seus cinco minutos, que mais pareceram horas de uma boa prosa. Valeu a interrupção de minha atividade. Foi como se tivesse criado um intervalo para falar com a amiga. Embora pareça estranho, mas, foi o que realmente senti.

Daquele momento em diante, a ampulheta faz parte de meus aparatos de trabalho. Sempre que há necessidade de coordenar parágrafos desencontrados, dar continuidade à ideias interrompidas, faço uma pausa. Ponho a ampulheta a trabalhar e enquanto por cinco minutos ela me informa que o tempo está passando, vou pensando no retorno ao texto, e, quando o faço, consigo tornar a continuidade solucionada.

Minha ampulheta, presente de aniversário, além do tempo, marca um intervalo para reflexão, também, uma pura e inesquecível amizade.

Marcos Costa Filho
Enviado por Marcos Costa Filho em 14/06/2011
Código do texto: T3035078