Notório
O jovem estaria (está, estava) sentado, em um dos bancos de canto do pátio, os outros correm, gritam, ele permanece sentado, calado, enquanto escreve em seu caderno, escreve, rabisca, desenha, ouvi dizer que ele desenha muito bem, ouvi também que ele esta aqui desde muito tempo, é um “veterano”por assim dizer, não sei quais foram os verdadeiros motivos que o trouxeram aqui, alguns dizem que foi o pai quem o pôs ali desde pequeno sem nenhum motivo aparente, outros dizem que foram os remédios em excesso, dizem também que era uma criança diferente, que, de uma hora pra outra, enlouqueceu. Nenhum me parece verdadeiro, eu acho, em minha inválida opinião, que ele esteja aqui por opção, viu que precisava, sentiu essa necessidade, e já que ninguém se preocuparia em fazê-lo, ele mesmo o fez, pegou o que era necessário e veio, ou então para se esconder ou fugir. Nesse momento não interessa mais saber. Nunca oi, nunca bom dia, boa tarde, boa noite, nunca falar, como ele consegue, esse silêncio, não o perturba? Em situação como a dele, qualquer um já estaria falando com as paredes para aplacar o desespero. Por dias eu o observo, para poder entender ao certo o que ele faz ali, me aconselharam manter a distância, portanto não me aproximo, vejo que ele fica sempre ao lado esquerdo do banco, é engraçada a forma como essa falta de notoriedade o torna notório, porém é o único ali que parece ainda guardar um pouco de lucidez, há um certo desinteresse em seu olhar, mas não é um “desinteresse” qualquer, não, é algo gritante, visceral, que se destaca em um oval apagado, com tons de ironia, ou sarcasmo, é algo que desafia e irrita, eu observo por alguns dias, mas logo desisto sem perceber, quando me dou conta ele não está mais ali, então finalmente eu capto sua essência, que é como o aroma de um perfume forte e enjoativo, instiga e incomoda no inicio, mas logo se acostuma ao olfato, e quando se esvai, isto é, acaba, descobrimos que de alguma forma sentimos falta.