SABORES DA MINHA INFÂNCIA

Ultimamente me pego lembrando a rotina diária na casa da minha avó. A lembrança é tão forte, que chego a sentir o aroma das comidinhas feitas por ela, e então me sinto invadida por uma saudade gostosa, de um tempo bom que certamente não volta mais. Minha avó era especialista em inventar “comidinhas”, como ela mesma definia, já que eu dava muito trabalho para comer alguma coisa, diferentemente de hoje.

Assim, recordo o almoço servido aos sábados – dia de feira em João Câmara – a cidade onde morávamos. Dia de feira em cidade do interior é um dia de festa e requer comida especial. O cardápio na casa de vovó era composto por farofa de feijão verde com carne de carneiro, prato que tem o sabor da minha infância e que eu adoro até hoje.

Aos domingos, o almoço também era especial e reunia todos os filhos, noras, genros, netos e primos em torno da grande mesa da cozinha. O cardápio do domingo era formado por um delicioso pirão batido na tigela, acompanhado por arroz branco e uma enorme perna de boi. Ao meu avô, sentado à cabeceira da mesa, cabia a responsabilidade de bater a perna do boi, para a retirada do tutano – gordura pura - que todos saboreavam sem qualquer preocupação com o colesterol. Depois do almoço todos se sentavam na sala de estar, para ouvir meu pai tocar trombone, acompanhado pelos pífanos tocados por meu avô e meu tio.

Havia domingos em que vovó decidia mudar o cardápio. Pegava, então, algumas das galinhas que criava no quintal, e fazia galinha à cabidela. Nessas ocasiões o prato principal era diferente, mas delicioso do mesmo jeito e tanto eu quanto os meus primos comíamos à vontade, para sossego de nossos pais.

O jantar na casa de vovó também era momento de festa. Especialmente para as crianças. Nossa comida favorita era farofa d´água com carne de sol assada na brasa – prato típico e caro nos restaurantes potiguares.Toda a comida feita por minha avó era preparada num enorme fogão à lenha, o que dava um sabor especial aos alimentos. Mesmo depois de ganhar um fogão à gás, ela preferia cozinhar no velho fogão de lenha, hábito que manteve enquanto teve forças.

O café era outra de suas especialidades e tinha um bastante sabor especial. Ela comprava os grãos, que torrava no fogão à lenha e depois pilava num enorme pilão, cujo barulho ainda consigo ouvir. Basta fechar os olhos. Mas nós, as crianças, não tomávamos café na casa de vovó. Ela dizia que queimava os neurônios e isso dificultaria o nosso rendimento escolar. Ninguém questionava. Apenas obedecia. Os adultos, porém, deliciavam-se tomando café torrado em casa, prazer que eu só pude comprovar depois que me tornei adulta.

Outra comida que a gente adorava, era uma tal de “mala assada” – espécie de omelete feita com farinha de mandioca, ovos e charque picada, que a garotada comia de boca cheia. Sempre que a gente fazia “birra” para não comer, nossas mães recorriam às comidinhas de vovó e tudo virava uma festa.

A hora do lanche era outro momento inesquecível e cuja lembrança me enche a boca de água. Uma das delícias produzidas pelas mãos de fada da minha avó era um doce feito de coco com mamão, que agradava às crianças e aos adultos.

Para meus primos e eu, a casa de vovó era sinônimo de festa, alegria e comida gostosa. Além do mais, vovó era muito carinhosa com todos nós, enquanto vovô nos contava as histórias de suas famosas caçadas na Serra Verde, aventuras que até hoje vivem em nossa memória. (02.06.2011)