Ao querido amigo Leo Gargi
Não,meu amiguinho,um escritor não é qualquer um que escreve.Se assim fosse, guarda-livros que tem muito o que pôr no papel,apontador de obras, garçon de restaurante que anota pedido,todos esses seriam escritores.
Professor também,mas.grandes escritores foram também professores.
Na verdade,eu acho que o escritor nasce feito; muitas vezes tem que ser burilado como o Michelangelo tirando o Davi de um bloco de mármore. Quase sempre o escritor nem sabe que é escritor.Até vir o despertar.
E te digo,escrever é como fazer cocada.
Surpreso?Pensas que estou de gozação?
Não estou.
Para fazer uma boa cocada primeiro é preciso ter vontade de comer cocada.Aquela urgência em que sabes que tens que fazer,correr para a cozinha, escolher o coco seco ,descascá-lo ,passar no ralo grosso, ,misturar um pouco de água ao açúcar , untar de óleo uma panela,levar essa mistura a ferver sem mexer nela, até ficar uma calda de fio médio, despejar o coco na mistura, acrescentar o cravo e mexer até se desprender do fundo da panela.
Algumas pessoas acrescentam leite condensado.
Está pronta a cocada.
Pois,escrever,não sabes,menino,é parecido.
Surge a idéia que vem brotando e abrindo caminho desde o fundo do nosso ser consciente.
Corremos para o computador.Deixamos a idéia fluir,ela toma conta de nós e os dedos vão correndo sobre o teclado quase num transe,nos possuindo,tomando conta de nós que nem temos tempo de preparar a mistura e já vamos levando ao fogo dos nossos ímpetos ,fazendo o texto florescer e aparecer,soberano.
Terminado,vamos ás correções.Provar o sal, sentir a textura,acrescentar ou não o leite condensado,mexer aqui,mudar ali,colocar na compoteira para ficar mais chique, deixá-lo espalhado pela assadeira para endurecer melhor- aí temos o nosso ofício.
Isso chama-se elaborar texto,fazê-lo ao gosto do freguês,ampliá-lo ou torná-lo mais conciso,porém,sem nunca modificar a idéia que o originou.
Ousar,criar novas situações,inovar, acrescentar novos ingredientes,amor,ódio,paixão, tudo isso é válido no laboratório da escrita.
Mas,não se deve tocar na essência,
Ser fiel a si mesmo e ao que acredita eis o que separa o escrevinhador do escritor.