Teorias Malucas
"Não penses compreender a vida
nos autores. Nenhum disto é capaz.
Mas à medida que vivendo fores,
Melhor os compreenderás."
(Mario Quintana)
- Meus amigos, a insatisfação permanece. Nenhuma porta nova se abre. Aliás, até a palavra nova é irritantemente velha. Li há cinquenta anos, alguém nos apresentando o novo. Que novo? Cinquenta anos passados, vejo outros me apresentando o mesmo novo. Não é para desanimar? O que existe de fato são caminhos velhos, caminhos rotos, onde todos já andaram e nunca chegaram a lugar nenhum. Somos pigmeus neste imenso universo procurando uma porta de saída e não existe porta. O que fazemos, então? Uns, começam a chorar, outros a rir. Há os que meditam, e os que trabalham. Outros mais, sonham. No desespero, acendemos a fogueira de nossas vaidades. E dessas labaredas vão aparecendo explicações mirabolantes.
Sem dúvida, somos criaturas singulares e já começamos a ficar velhos no mundo.
No entanto, há quem recuse essa nossa singularidade. É e o que temos de mais importante: a nossa singularidade!
Em todas as épocas, parece uma sina, em geral, aparece um sociólogo, querendo inventar novamente a roda. Agora, no século 21, surgiu um grupinho querendo acabar com o homem, esse ser que estamos acostumados a ver na rua, nos estádios, nas universidades. Para essa gente, o ser humano não existe, só os sistemas existem.
Até na literatura, surge um movimento que nega o autor da obra, querem uma linguagem literária impessoal, não humana. Lutam pelo anti-humanismo. São os estruturalistas radicais.
O que acho mais interessante é que esses humanos, teóricos da sociologia “moderna”, andam pela rua, apresentam suas teses nas universidades, vão à praia, comem sanduíches no McDonalds e, segundo a teoria que eles inventaram, simplesmente eles não existem.
Os nossos antepassados já tiveram que aguentar os chamados solipsistas, que afirmavam: a única realidade era o “eu” deles e o mundo era simplesmente criação desse “eu”.
Agora teremos que suportar a torcida contrária: só o mundo existe, o “eu” não existe.
Ora, francamente, o ser humano tem a mania de ser radical, é oito ou oitenta. Não consegue permanecer no meio-termo. Ou ele se ama, ou se odeia.
O que mais me intriga, meus amigos, é que conheço um solipsista, o tal que afirma que só ele existe, que conversa comigo e não fica encabulado. Eu é que fico nervoso de conversar com ele. Por outro lado, o sociólogo radical, o que diz que o sujeito não existe, anda desavergonhadamente pelas ruas, casa-se, faz filhos, vive até melhor que um pobre coitado como eu que acredita que tem existência própria e que o mundo é uma realidade bem palpável, tanto que estamos constantemente tropeçando em pedras, paus e até nestes sociólogos que não existem. Se ao menos falassem em outras realidades, a serem descobertas, seria perfeitamente aceitável.
Nesta altura, o conferencista é interrompido. Alguém da plateia pergunta:
- O senhor poderia nos dizer por que aparecem pessoas defendendo teses aparentemente tão absurdas?
- Sim – responde o conferencista. Só posso atribuir a uma impaciência. Não sabem esperar pacientemente pelas descobertas que o velho homem vem conquistando paulatinamente. O meu medo, senhores, é que apareça um novo grupo afirmando que estamos sonhando e que nada existe. E se alguém mostrasse os morros, os rios, os oceanos, as casas, os prédios e as pessoas circulando pelas cidades e pelos campos, esses impacientes diriam que é tudo ilusão e ainda mandariam incendiar o mundo, para que não restasse pedra sobre pedra. Uma pena que não tenham a humildade do grande músico Duke Ellington, que perguntado sobre a vida, sem renegar a sua existência, respondeu com alegria: “ O destino tem sido gentil comigo”.