Era apenas um tio
Era um tio, coitado, parecia mesmo que jamais iria passar de um ~, apenas uma linha passante, andante e caminhante.
Trabalhava para o tesouro, fiscalizava, contabilizava e como sempre as contas estavam certas.
Aos olhos que pouco viam tudo parecia naquele ~ certo, tudo sempre igual.
Seu lazer era olhar estrelas por lunetas, estas ele tinha as de última geração.
Para essa atividade se acomodava, se instalava sempre na mesma posição.
Analisava, olhava, espiava o céu.
Da música, gostava de freqüentar concertos, sabia toda a programação antecipadamente.
Antecipada também era a compra dos ingressos, o lugar que iria se acomodar.
Levava sempre um binóculo para enxergar melhor
Olhava a vida por binóculos e o céu por lunetas e contava, não histórias, mas dinheiro e tudo contabilizava.
Uma característica interessante no ~ era a de que gostava de visitar alguns poucos parentes e alguns raros amigos ,visitas marcadas sempre antecipadamente.
A estas visitas ia sempre de terno bem composto, camisa bem passada, gravata discreta e acompanhado sempre por um guarda-chuva. Este usado como apoio quando sentado à poltrona, apenas para ficar mais formal, pois problema de coluna não tinha, sua saúde era perfeita!
Aposentou-se do tesouro, mas pouco mudou na vida, apenas olhava por mais tempo o céu através das lunetas e freqüentava mais concertos de maneira sempre regular e antecipada programação.
Quanto às visitas não fazia mais, também se aposentou dessa atividade.
Ao final, quando não mais podia olhar o céu através das lunetas e não podia mais ir aos concertos programados, passou a freqüentar a cadeira de balanço da sala de visitas, mas sempre só e a pensar por horas a fio.
Neste período as lunetas jaziam em uma sala muito bem colocadas, os binóculos em um armário, os guarda - chuvas no armário também adequado, mas algo era interessante.
Havia um armário em que jaziam também pilhas e pilhas muito bem organizadas cronologicamente de programas de concertos antigos, todos que freqüentou durante sua vida.
E lá permanecia o ~ na cadeira de balanço, em intervalos de pensar e dormitar.
Ao final do final, seu irmão mais novo e esperto em negócios , tira-lhe nos intervalos dos sonos e do pensar na cadeira de balanço procurações para movimentar um volume expressivo de dinheiro que o ~ havia acumulado em conta bancária enquanto funcionário do tesouro ativo e aposentado.
Até que entre o balançar da cadeira, o sono e o pensar o ~ se foi.
Deixando de herança: lunetas, binóculos, programas de concertos e guarda-chuvas.
Dinheiro não existia mais.
A bufunfa já tinha sido passada para a mão do irmão que adorava acumular tesouros e nem binóculo tinha ou queria, nem luneta, nem programação, seu único e delirante lazer era acumular tesouros em bancos .
O irmão mais novo na verdade também era tio, mas sem lunetas, sem binóculos, sem guarda-chuvas para fazer lembra-lo.