Hoje acordei cansada. Apesar da noite dormida, restou um cansaço sem limites. Custou-me levantar da cama, abrir minha janela...Acordar. A brisa que sempre me acariciava, virou um vento chato e frio. Custou-me olhar o espelho e descobrir rugas que ontem não estavam aqui. Olhar meu olhar triste sem uma aparente razão de estar. Hoje eu acordei cansada. Cansada de mim... Hoje eu estou triste. De repente aquela alegria que fazia meus olhos brilharem, passou. Restou esse olho opaco, essa ausência de vontade de continuar. O riso sempre frouxo deu lugar à lágrimas boiando...Boiando...
Analiso friamente meus traços e procuro àquela mulher que ontem era só vida, só alegria... O cabelo que reluzia, agora vejo que não passam de melengas penduradas no meu casco. E as maõs... Ganharam sulcos e perderam a seda que ostentavam. Meus passos estão pesados, como se de repente tivessem jogado em mim todos os anos que tenho, mas que não sentia.
Hoje acordei cansada. Cansada de olhar em volta e me encontrar sozinha quando ainda ontem eu era uma multidão. Que estalo foi esse... Não sei. Será que é assim o despertar do envelhecer... Assim de maneira tão abrupta, tão sem avisos... Ou era eu que continuava criança ignorando as centenas de anos vividos...
Até os pássaros que me acordavam diáriamente pela madrugada, hoje não vieram. Nenhum canto. Nenhum pio. Um silencio se instalou aqui e em mim. Até o coqueiro que avisto de minha cama, hoje está parado, inerte. Nem o cheiro de maresia, sempre tão cantado por mim, aconteceu.
A natureza está solidária com meu estado de espírito. O sol ,meu pai, que está sempre por aqui a me aquecer, deu lugar a uma chuva fina, fria e cortante. Não gosto dessas lágrimas que caem do ceu. Quando o ceu chora, choro com ele. Gosto do calor do meu sol rachando tristezas e me fazendo aquecer.
Nem vou colocar meu roupão florido, hoje ele não combina comigo. Talvez fique na cama, me enrole no lençol, entre em mim numa procura por mim. Talvez eu reencontre a mulher-menina que se dizia poeta, que buscava a felicidade como primeira e derradeira forma de viver. Talvez o dia de hoje passe rápido para que amanhã o sol volte e me acorde dizendo que é possível viver além da dor.