No primeiro semestre de Teologia, nossa professora de Língua Portuguesa nos pediu uma redação cujo tema era: MEU VELÓRIO.
               À época, tive muita dificuldade em escrever sobre o tema, não por receio da morte ou coisa parecida, mas por achar o velório totalmente desnecessário.
               Não podia imaginar meus filhos e familiares à volta de meu corpo sem vida. Não estaria mais ali, seria apenas uma carcaça descartável e biodegradável. Sempre lhes dizia que após a doação dos órgãos ainda úteis, me cremassem e despejassem as cinzas em qualquer lugar, até em uma valeta . . . Quem quiser me fazer algo, que me faça em vida.
               No velório de meu pai (o único até agora que ‘co-protagonizei’), vivenciei as horas intermináveis, os cumprimentos, o apoio de corações afins. A única vantagem de ver o ente querido em um caixão é a constatação real da morte. Ali, naquele corpo, meu pai já não estava. Por melhor que os agentes funerários o arrumassem, não era mais ele.  
               Para mim, era o suficiente; encerrava-se ali o velório.
               Mas no decorrer das horas infindas, percebi que cada qual tem um jeito próprio de se despedir. Vi seus amigos, idosos como ele, um a um, se despedirem, cada qual de seu jeito. Não gravei o nome da maioria, pois eram muitos. Colegas do Exército, irmãos da Maçonaria, rádio-amadores . . . Alguns oravam com as mãos sobre o corpo de meu pai, outros conversavam com ele, justificando a ausência de alguns, passando recado de outros, como se meu pai os escutasse. 
               Um deles, colega de Arma e de Loja, cabelos branquinhos, mãos já trêmulas, foi um dos primeiros a chegar e ficou até o final, como que aproveitando o tempo de convívio restante ou expressando a consideração que tinha pelo amigo; contando a quem ouvisse sobre a amizade que tinham.
               Foram despedidas singelas, comovidas, mas não entristecidas ou soturnas; soavam mais como um ‘até breve’ . . . o afastamento é temporário, estamos todos na fila, na ordem unida . . .
               Lembro que meu pai, apesar de não desejar morrer, se ressentia ao saber da morte de um conhecido ou parente jovem (um jovem pai ou mãe). Era como um sentimento de ‘mea culpa’, não sei ao certo. Penso que seja assim com a maioria dos idosos.
               De qualquer forma, continuo não gostando de velórios, mas respeito à necessidade, pois é a oportunidade do adeus, do até breve, seja lá o que for . . . e é um direito que não cabe a mim revogar.

               Quanto ao meu, não vou me preocupar, pois não estarei presente. Apenas gostaria de caixão fechado. Sou vaidosa . . . e creio que morta, não será meu melhor ângulo.








Imagem retirada do GOOGLE.









 
 
 
 
 
 
 
 
 
   

SIMONE SIMON PAZ
Enviado por SIMONE SIMON PAZ em 03/06/2011
Reeditado em 03/06/2011
Código do texto: T3012507
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