SOBRE PALHAÇOS E HOMENS

Como escrever sobre palhaços? Qualquer coisa que se diga seria absolutamente irrelevante diante dessas figuras tão alternas em nosso tempo. Por isso tudo que escrevo, embora nada signifique para estes, serve para os "outros".

Quando vemos um palhaço, algo em nós faz lembrar muitas coisas: talvez, um sentimento de alegria e felicidade que deixamos de lado face às atividades de nosso cotidiano; talvez uma lembrança de nossa infância, quando o termo "preocupação" ainda não fora escrito em nosso dicionário; talvez até mesmo uma inveja por um ser tão bobo que parece não se comprometer com os problemas, mas ri deles. Bem, muitas outras coisas poderiam ser descritas aqui, mas não vêm ao caso.

Acredito que, quando vemos um palhaço, vemos a nós mesmos ainda crianças ou como poderíamos ter ficado se esquecêssemos que crescemos. Vemos o tempo desperdiçado e, nessa angustiosa pena, nos envergonhamos. Mas quando um palhaço nos olha, algo acontece, algo que não está nos planos de ninguém. Seu olhar é um espelho de nossos desejos e sua concretização, somos redimidos, nossa criança nos perdoa e quer brincar, esquece tudo o que fizemos e nos invade com sua atrevida piedade. Sem defesa, descobrimos que ainda podemos dar um presente muito querido a essa criança, na verdade, é seu alimento e por meio dele fazemos a experiência espiritual mais primordial e simples que um ser humano pode viver, "o sorriso", quando não, "a risada" ou, em casos mais extremos de libertação, a "gargalhada", ou tudo isso junto.

Brincamos, sorrimos e nos divertimos. Creio que Deus assim também o faz, por isso criou as crianças. Mas elas crescem e se tornam ásperas, preocupadas e briguentas, e foi justamente por isso que, num momento na cadeia da evolução humana, algo entre a "hominização da vida" e a "humanização do homem", Deus introduziu, em algumas pessoas, a capacidade de despertar o mundo para a alegria de estar vivo, ou seja, criou os palhaços.

São raros os reconhecidos, muito anônimos e outros tantos desprezados pelos surdos que não entendem o grito mudo da alegria dos palhaços, tudo para que se cumpra: "Vendo não vejam e ouvindo não compreendam".

Poderia elencar muitos dos bons: Chaplin, Francisco de Assis, João XXIII, Cascatinha e, por que não, o próprio Filho de Deus, Jesus Cristo, que diante dos homens velhos e carrancudos proclamou uma verdade que abalaria todo o processo da maturação humana: "Deixai vir a mim a criancinhas, por que delas são todas as bolinhas de gude do Reino dos Céus (ou quase isso)!

Ramires karamázov
Enviado por Ramires karamázov em 02/06/2011
Código do texto: T3010823
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.