IMPOTÊNCIA. NADA PIOR.
Já que o todo da existência nos vem do estado de estar desperto, tudo sem exceção, há uma enorme agressão no sentimento da impotência. Um exemplo prático, que se autoexplica, é não podermos socorrer uma criança em perigo por nos faltarem meios mecânicos ou qualquer possibilidade, mesmo com risco de nossas vidas.
O rio químico comandado pelo cérebro que faz disparar a vontade sem conexão ao socorro físico nos leva ao total vazio da existência; se apresenta implacável a impotência. Dado o exemplo pragmático, passamos ao que se liga à frustração do mais excelente compartimento do nosso ser, o pensamento que se encerra no cofre da alma, o âmago de nosso altar interior onde cultuamos e cultivamos o que seria melhor.
Quando nada se pode fazer contra o sucesso das iniquidades, quando o escárnio afronta a sociedade organizada na vontade da lei que não se cumpre ou se impõe, quando a realidade ri sarcasticamente, na festa da contrariedade à lei, em deboche contínuo em vezes multiplicadas, apregoando que nada se pode contra quem pode, quando o poder fica acima da lei e esta serve para desservir, tombamos inermes e inertes.
Estamos diante da impotência, doença que mata a cidadania no processo da representação, que nos indica a mudez e a cegueira a que estamos acorrentados pelos vícios da vontade enfraquecida, ao invés de bradar a todo tempo e instante o que não presta e os que não prestam, ao menos formalmente listando as balizas da lei que os próprios legisladores fizeram e pisam em cima, com desassombro e envergadura, como gigantes do nada, pois nada fazem que não lhes assista e desassista aos que assistidos precisam ser, logo que representados por aqueles que não os representam.
A impotência é cruel maximamente por martirizar duas vezes, a primeira pelo erro da ação anterior, o voto de quem o exerce, a segunda pela patologia da inação vestida da impotência de consentir silenciosamente com o que somos brindados, desmandos sucessivos, com galas e pompas de configurarem benefícios outorgados a quem precisa.
Não há justiça sem Deus. Pela corrupção existente de sua criatura o Criador inundou o mundo para reabilitar, possivelmente, o que se degradou e corrompeu. Deu a Noé o destino de traçar novos rumos, ao que parece não teve sucesso e, o pior, estamos impotentes para fazer qualquer remissão. Mas o processo da esperança, embora amorfo, sufocado, submisso ao talante de uns poucos, ao menos este, viverá e vive em presságio de espera no grito dos que ainda creem no homem.