ÉBRIOS - OS ESQUECIDOS PELA SOCIEDADE
QUANDO SERES HUMANOS
CHEGAM AO FUNDO DA SUA
MAIS VIL CONDIÇÃO ELES SE TORNAM
COMO SE INVISÍVEIS FOSSEM
O homem, na verdade um trapo humano, estava sentado no meio fio da praça, e ao seu redor diversos trapos humanos, homens e mulheres perdidos em loucuras etílicas, ausentes de tudo.
Frascos de aguardente, restos dos restos de comida juntada aqui e acolá. Todos juntos misturados num bando bem aparente, ignorados devidamente por transeuntes circulantes, todavia, ausentes da condição de desespero e loucura controlada por uma força misteriosa naqueles seres cambaleantes.
Eles confabulam em um dialeto que só eles entendem. Ali eles dormem, urinam, defecam, se amam, se odeiam e se matam ou vão morrendo aos poucos no sol, na chuva.
Seus rostos são apáticos, seus sorrisos zombarias, quando choram refletem a insanidade de uma vida suportada em nada. Quando estão sérios são como mortos, dormindo eles não existem e quando estão sóbrios são como zumbis a procura de mais uma porção do líquido cáustico no recipiente transparente que inebria o pensamento.
O homem sentado no meio fio da praça, num lapso de lucidez não consegue entender tamanha escravidão e o porquê daquela cerca invisível que evita que ele usufrua da liberdade das pessoas que ao redor passam como aparição diante de seus olhos que já não consegue se fixar longamente em nada a não ser na garrafa vazia que jaz à sua frente.
Então num fiapo de consciência ele delira e vê dentro da embalagem a ânsia do seu desejo insaciável, e ávido ele agarra o vidro e leva o gargalo aos beiços brancos e inchados sugando com sofreguidão como se dali saísse a fonte de sua vida, e numa irritação preguiçosa ele percebe que ali dentro apenas o ar reside, e ele detesta o ar, pois quer um tempo em que tudo ao redor seja álcool, e na sua insanidade ele percebe que não dá, então com o pouco de forças que lhe resta, como vingança, ele atira a garrafa que explode no pavimento da rua espalhando cacos por todos os lados e com um sorriso podre ele parece comemorar vitória por destruir a causa de sua frustração, por não poder receber na sua garganta ressequida o licor tão desejado.