OS FANTASMAS DA NTERNET
Normalmente levanto cedo e como gaúcho não dispenso um chimarrão. O dia amanheceu frio e seco. Tomei meu chimarrão e decidi passar um café. Não havia pó. Esqueci de comprar. Lembrei que havia comprado um sache de café solúvel que quebra o galho evitando ir ao mercado só pra comprar café. Preparei o café e achei o gosto estranho. Bolas havia comprado café descafeinado. Porque diabos alguém tomaria café descafeinado? Bem, paciência, vamos lá. Liguei o computador e logo surgiu uma mensagem: “ Decrépita Bússola quer seu amigo no Orkut”. Essa agora,você já adicionou um relógio como amigo? Lendo com atenção percebi tratar-se de alguém que faz música, mas a julgar pelo nome adotado, bem posso imaginar o tipo de música. A internet está cheia de fantasmas e gente que se esconde sob os mais esdrúxulos pseudônimos quase sempre com a intenção de vender algo ou mandar uma daquelas correntes que te prometem felicidade em 20minutos, desde que você envie para 20 amigos. Mantenho uma conta no Orkut geralmente ao abandono pois tenho lá, parentes e amigos que raramente me enviam alguma mensagem. Quando entrei nisso, fui convidado, mas desde que o Google abocanhou a rede, basta entrar no gmail e pimba, seu Orkut está pronto. Agora é só sair a catar amigos. Tenho feito um esforço para tentar entender o que aconteceu com o planeta e as pessoas desde que nasci. Tudo está mudando muito rápido. A agressão passou a ser uma mera alternativa para ferir física ou intelectualmente escondido por um apelido qualquer, geralmente de mau gosto. Vejo no jornal o anúncio de uma exposição de arte em Porto Alegre sob o título: "Agora/Ágora - Criação e Transgressão em Rede". No Santander Cultural. Segue um trecho da entrevista com a curadora da mostra:
A temática do "tempo" é a ideia central do projeto e consequentemente da exposição, que aborda o rápido curso da vida e o resultado disso para o entendimento do mundo atual. Todas as obras escolhidas, mesmo nas mídias tradicionais (pintura, escultura, desenho), envolvem o tema ou foram feitas em meios expressivos que utilizam o tempo (filme, vídeo, fotografia, videoinstalação).
Hibridismo, sobreposição, instantaneidade, ou seja, a vida atual pede tudo ao mesmo tempo, agora. A mudança da percepção do tempo é uma característica do nosso agora. Há muito abandonamos a ilusão de atingir o todo, de ter uma explicação totalizadora de nosso lugar no mundo. Segundo a curadora, "nossa atividade diária é costurar fragmentos, flashes, instantes, em um quebra-cabeças que jamais se completará. Nossa certeza de hoje é nossa dúvida de amanhã. Não existe mais a noção de que o passado explica o presente e iluminará o futuro. A validade das coisas é relativa ao momento que elas habitam", conclui Angélica de Moraes. A plataforma Web Ágora completa o projeto Agora/Ágora - criação e transgressão em rede. A palavra Ágora define bem sua característica: Ágora, na antiga Grécia, era o local onde os cidadãos se reuniam para resolver os destinos da cidade.
Se entendi bem, transgressão deixou de ser um delito? Então capturar o trabalho dos outros passa a ser legal? È isso então que as pessoas fazem? Costuram fragmentos, flashes, instantes de um eterno quebra cabeças? Dentro disso entra o verbo matar ou transgredir, por culpa de flashes momentâneos? Acho que agora começo a entender. Virou tudo uma bagunça. Conjuntos musicais medíocres faturam alto por conta da transgressão e da agressão aos conceitos artísticos? Definitivamente, meu prazo de validade acabou. É a banalização globalizada da vida.