MÃOS AO ALTO
O sujeito estava mesmo maltrapilho e sujo. Quanto mais tentava distanciar-me dele mais o azarento apertava o passo. Vez em quando eu observava de rabo de olho. O individuo segurava um objeto, possivelmente um revólver, um estilete, não me preocupei naquela altura dos acontecimentos em certificar-me do que era, apenas tentei fazer uma oração enquanto apertava os passos.
Estava realmente em pânico. Caía a tarde, a rua estava quase deserta, na capital aos domingos é quase sempre assim.
Após ter descido do ônibus na rodoviária, resolvi pegar o lotação cujo ponto ficava a alguns quarteirões dali.
Tanta coisa me passava pela cabeça. Busquei inutilmente avistar algum policial, parecia que toda a guarnição estava de folga naquele dia.
Tentei mudar de direção para ver se despistava o canalha, dobrei a esquina, apertei ainda mais o passo, na verdade já estava correndo. De longe enxerguei o ponto de parada do ônibus, não havia ninguém aguardando, a coisa estava mesmo ficando feia.
Como num golpe de sorte, desses em que a cavalaria aparece no instante exato, pude ver vindo ao longe a bendita condução. O coração bateu mais forte, dei sinal ainda correndo. Aqueles poucos metros de distância pareciam quilômetros, cada segundo parecia horas. Ouvi por duas vezes aquela voz horrenda:
_ A Carteira!
_ A carteira!
Podia ouvir sua respiração ofegante se aproximando.
O ônibus parou. Antes que a porta se abrisse senti aquela mão pesada tocar meu ombro. O medo tomou conta de mim. Jamais havia sido assaltado. No noticiário muitas vezes os assaltos são seguidos de morte, foi o que me veio à mente. Olhei apavorado para trás; a voz eloquente bradou ainda mais forte, enquanto estendia a outra mão:
_A carteira Moço!
_Deixou cair lá atrás!
Reconheci ser a minha carteira que o tal sujeito me entregava.
Ainda trêmulo, mas já aliviado tentei me acalmar. Abri a carteira e verifiquei, todos os documentos e todo o dinheiro ainda estavam lá dentro, nota por nota. Com aquele dinheiro daria para o tal sujeito fazer toda a compra do mês, quem sabe acertar contas em atraso.
Naquele momento lembrei-me novamente de Deus. Ergui as mãos para o céu e agradeci comovido.
Como gesto de agradecimento tentei gratificar o cidadão, porém, antes que pudesse fazê-lo o vi distanciar-se, como quem não espera recompensa.
Assustei-me no dia seguinte ao ver aquele rosto no noticiário na televisão: Catador de papel morre atropelado na avenida Amazonas na noite de domingo.
Saulo Campos
Itabira MG